Análise
Crise no Leste da RDC expõe fragilidades da diplomacia regional
A persistente instabilidade no Leste da República Democrática do Congo (RDC) voltou a ocupar o centro das atenções diplomáticas regionais e internacionais, numa altura em que se multiplicam os alertas sobre o agravamento da situação humanitária e os riscos de uma escalada militar de grandes proporções. Os recentes desenvolvimentos no terreno, marcados por novas conquistas territoriais do movimento M23, alegadamente apoiado pelo Rwanda, colocam em causa os esforços de mediação e fragilizam os compromissos assumidos em acordos recentes.
A deslocação do Presidente congolês, Félix Tshisekedi, a Luanda, para um encontro directo com o Chefe de Estado angolano, João Lourenço, surge como sinal da gravidade do momento. Angola, enquanto actor central na diplomacia africana e Presidente em exercício da União Africana, tem sido chamada a desempenhar um papel de equilíbrio, apostando na via do diálogo e na busca de uma solução política para um conflito que se arrasta há décadas. Apesar das pressões, Luanda tem evitado qualquer envolvimento militar directo, mantendo uma postura de prudência e defesa da solução pacífica.
No plano internacional, a posição da França, expressa no Conselho de Segurança das Nações Unidas, ao exigir o retiro imediato das forças rwandesas do território congolês, reforça a leitura de que o conflito deixou de ser apenas uma questão interna da RDC. As acusações de violação da soberania congolesa e de apoio militar ao M23, igualmente reiteradas pelos Estados Unidos, aumentam o isolamento diplomático do Rwanda, ainda que Kigali continue a rejeitar todas as alegações.
A tomada de localidades estratégicas, como Uvira, no Sud-Kivu, representa um ponto particularmente sensível, por se tratar de uma zona fronteiriça com o Burundi, elevando o risco de regionalização do conflito. Este cenário preocupa não apenas os países vizinhos, mas também os organismos internacionais, que alertam para o colapso das condições de segurança e para o sofrimento crescente das populações civis, já duramente afectadas por deslocações forçadas, fome e violência armada.
A fragilidade dos acordos recentemente assinados, incluindo os entendimentos patrocinados por actores internacionais, evidencia os limites da diplomacia quando não acompanhada de mecanismos eficazes de verificação e de vontade política real por parte dos beligerantes. A incapacidade de garantir um cessar-fogo efectivo e verificável levanta dúvidas sobre a credibilidade dos processos de paz em curso.
Neste contexto, Angola vê reforçada a sua responsabilidade como mediador regional, mas também os seus dilemas estratégicos. Qualquer passo em falso pode comprometer a sua imagem de actor imparcial e construtor de consensos. A aposta continuada no diálogo, na pressão diplomática e no envolvimento dos fóruns multilaterais surge, assim, como a via mais coerente para evitar que o Leste da RDC se transforme num novo epicentro de instabilidade regional.
A crise congolesa confirma, mais uma vez, que os conflitos em África exigem soluções africanas, mas sustentadas por compromissos firmes, respeito pela soberania dos Estados e prioridade absoluta à protecção das populações civis. Sem isso, a paz continuará a ser uma promessa adiada.
