Opinião
Repensar o recrutamento militar em Angola: um modelo híbrido para o futuro

O recrutamento militar é um tema estratégico para qualquer nação, pois está directamente ligado à segurança nacional, à estabilidade política e ao desenvolvimento socioeconómico. Segundo Huntington (1957), “as Forças Armadas de um Estado são o reflexo da sua organização política e da sua capacidade de adaptação às mudanças sociais”. Dessa forma, a maneira como um país recruta os seus militares reflecte a sua abordagem em relação à defesa e ao desenvolvimento da juventude.
Em Angola, o modelo de recrutamento precisa de ser repensado para atender tanto às necessidades das Forças Armadas Angolanas (FAA) como ao desenvolvimento do capital humano do país. Para tal, propomos um modelo híbrido, inspirado em exemplos internacionais, mas ajustado à realidade nacional, combinando serviço militar obrigatório selectivo e recrutamento voluntário com incentivos estruturados.
O Actual Sistema de Recrutamento em Angola e os seus Desafios
Actualmente, o recrutamento militar em Angola é regulamentado pela Lei do Serviço Militar, que estabelece a obrigatoriedade do alistamento para cidadãos de ambos os sexos entre os 18 e os 45 anos. No entanto, na prática, a incorporação depende das necessidades das FAA, o que gera um modelo de recrutamento selectivo, sem critérios claros de aproveitamento dos jovens.
De acordo com Moskos (1977), “a profissionalização das Forças Armadas depende da capacidade do Estado de atrair e reter talentos através de incentivos socioeconómicos”. No caso angolano, a falta de benefícios atractivos, o baixo reconhecimento da carreira militar e a ausência de programas de reintegração dos ex-militares no mercado de trabalho dificultam o recrutamento eficiente e motivado.
Um Novo Modelo Híbrido: Teoria e Prática
Diante dos desafios actuais, propomos um modelo híbrido baseado em teorias da sociologia militar e do capital humano, buscando um equilíbrio entre obrigatoriedade e voluntariado. Esse modelo assenta nos seguintes pilares:
1. Serviço Militar Obrigatório Selectivo
Baseado na teoria da “cidadania armada” de Janowitz (1960), que defende que o serviço militar deve ser um instrumento de integração social e cívica.
Todos os jovens dos 18 aos 20 anos devem apresentar-se para o alistamento, mas apenas um número específico será incorporado, conforme as necessidades das FAA.
Aqueles que não forem seleccionados poderão cumprir um serviço civil alternativo, contribuindo para sectores estratégicos como educação, saúde e infra-estruturas.
2. Recrutamento Voluntário com Benefícios Atractivos
Inspirado na teoria do capital humano de Becker (1964), que sugere que investimentos na educação e formação profissional aumentam a produtividade e o desenvolvimento económico.
Jovens que desejem seguir a carreira militar poderão alistar-se voluntariamente, independentemente da obrigatoriedade, recebendo incentivos como:
Formação técnica e profissional em áreas estratégicas para o desenvolvimento do país.
Bolsas de estudo para o ensino superior após o serviço militar.
Assistência médica e benefícios financeiros competitivos para atrair talentos.
Criação de programas voltados para áreas especializadas, como tecnologia militar, engenharia e cibersegurança, garantindo a modernização das FAA.
3. Programa de Integração Pós-Militar
Baseado na teoria da transição de carreira de Schlossberg (1981), que enfatiza a importância do suporte institucional para facilitar mudanças na trajectória profissional dos indivíduos.
O serviço militar deve ser reconhecido como experiência profissional válida, facilitando a integração dos ex-militares no mercado de trabalho.
Parcerias entre as FAA e o sector privado podem permitir que os soldados adquiram certificações técnicas durante o serviço.
Implementação de um programa de requalificação para veteranos para garantir oportunidades de emprego após a desmobilização.
Vantagens do Modelo Híbrido
Eficiência Militar: A teoria da “força militar eficaz” de Van Creveld (1991) afirma que exércitos modernos devem ser ágeis, bem treinados e tecnologicamente avançados. O novo modelo garantirá um contingente qualificado e motivado.
Desenvolvimento da Juventude: O serviço militar passará a ser um trampolim para o crescimento profissional, capacitando jovens com habilidades úteis para o mercado de trabalho.
Inclusão Social e Redução do Desemprego: De acordo com a teoria do “serviço militar como mobilidade social” (Segal, 1989), o recrutamento pode ser uma ferramenta de ascensão social quando combinado com formação educacional e profissional.
Maior Prestígio da Carreira Militar: Com melhores incentivos e reconhecimento profissional, mais jovens verão as FAA como uma opção de carreira promissora.
Finalmente, é necessário referir que o recrutamento militar em Angola precisa de evoluir para um modelo que equilibre segurança nacional, desenvolvimento económico e valorização da juventude. O modelo híbrido aqui proposto permitiria que as FAA se tornassem mais eficientes e modernas, enquanto os jovens angolanos encontrariam no serviço militar uma oportunidade real de crescimento pessoal e profissional.
Como afirmou Samuel Huntington (1957), “um exército forte não se constrói apenas com armas, mas com homens motivados e preparados para enfrentar os desafios do seu tempo”. O futuro da defesa nacional depende de estratégias inteligentes, e um recrutamento bem estruturado pode ser a chave para fortalecer Angola, não apenas militarmente, mas também economicamente e socialmente.