Opinião
O fim do gasóleo barato: Angola está preparada para a transição energética?
1. Contexto Socioeconómico de Angola e Impacto do Aumento do Gasóleo
Angola é um país com uma economia altamente dependente do petróleo, que representa cerca de 90% das exportações e mais de 60% das receitas do Estado (Banco Mundial, 2023). Essa dependência tem exposto o país a flutuações nos preços do barril de petróleo, impactando directamente as finanças públicas e a estabilidade económica.
Nos últimos anos, o Governo angolano tem implementado reformas económicas estruturais, incluindo a redução progressiva dos subsídios aos combustíveis fósseis. Essa medida, alinhada às recomendações do Fundo Monetário Internacional (FMI), visa corrigir distorções fiscais, atrair investimentos estrangeiros e estimular a diversificação económica (FMI, 2023).
O Instituto Regulador dos Derivados do Petróleo (IRDP), vinculado ao Ministério dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás, anunciou que, a partir de 24 de Março de 2025, o preço do gasóleo será reajustado para 300 kwanzas por litro, igualando-se ao preço da gasolina. Essa decisão terá repercussões em diversos sectores económicos, afectando indústrias, transportes, agricultura, hotelaria e geração de energia eléctrica, todos fortemente dependentes do gasóleo.
De acordo com Stiglitz (2002), aumentos no custo da energia impactam directamente a estrutura produtiva, podendo desencadear inflação, perda de competitividade e redução do crescimento económico. No caso de Angola, o impacto pode ser ainda mais severo devido à fragilidade da infraestrutura energética e à limitada diversificação da matriz de combustíveis.
Diante deste cenário, é urgente a busca por alternativas energéticas sustentáveis e economicamente viáveis, de modo a reduzir a dependência dos combustíveis fósseis, mitigar os impactos económicos e garantir maior segurança energética. Segundo Lovins (2011), a transição para uma matriz energética mais eficiente não apenas reduz os custos operacionais, mas também impulsiona a inovação e a sustentabilidade a longo prazo.
Este artigo propõe estratégias para a substituição do gasóleo, destacando soluções que podem fortalecer a economia nacional e garantir um desenvolvimento sustentável.
2. Indústria: Eficiência Energética e Fontes Alternativas
A indústria é altamente dependente do gasóleo, utilizado para alimentar maquinarias pesadas, aquecer caldeiras e gerar electricidade em fábricas. A substituição desse combustível deve ser feita de forma gradual e planeada, para garantir eficiência e competitividade.
Soluções propostas:
Gás Natural Liquefeito (GNL) e Gás de Petróleo Liquefeito (GPL): Angola possui grandes reservas de gás natural, que podem ser exploradas para substituir o gasóleo no sector industrial. Segundo Yergin (2011), o gás natural é uma alternativa mais barata e ambientalmente sustentável, reduzindo as emissões de CO₂ e os custos operacionais.
Biomassa e Biogás: O uso de resíduos agrícolas e industriais para geração de energia pode diminuir a dependência de combustíveis fósseis. De acordo com Leite & Leal (2012), a biomassa representa uma solução viável para países em desenvolvimento, pois aproveita recursos locais e reduz os custos com importação de combustíveis.
Electrificação Industrial: O uso de motores eléctricos em substituição aos motores a diesel pode ser uma alternativa eficaz. Conforme Goldemberg (2000), a electrificação da indústria melhora a eficiência energética e reduz a vulnerabilidade aos choques do mercado de petróleo.
Painéis Solares e Sistemas Híbridos: Segundo Jacobson & Delucchi (2011), a energia solar é uma das fontes mais promissoras para substituir combustíveis fósseis, pois os custos de instalação têm diminuído progressivamente e a tecnologia está mais acessível.
A implementação dessas alternativas requer políticas públicas de incentivo, incluindo linhas de crédito e incentivos fiscais para a modernização do sector industrial.
3. Agricultura: Redução de Custos e Sustentabilidade Energética
O sector agrícola é um dos mais sensíveis ao aumento do preço do gasóleo, pois este é amplamente utilizado em tratores, sistemas de irrigação e transporte de mercadorias. Para evitar o aumento dos custos de produção e o encarecimento dos alimentos, algumas estratégias podem ser adoptadas:
Irrigação com Energia Solar: De acordo com Chiaravalloti (2017), a energia solar para irrigação pode reduzir em até 60% os custos energéticos das propriedades agrícolas, garantindo maior competitividade e sustentabilidade.
Tractores e Máquinas Agrícolas a Biogás: O uso de biodigestores para a produção de biogás pode alimentar máquinas agrícolas. Segundo Kammen & Dove (1997), essa solução reduz a dependência do petróleo e melhora a gestão de resíduos orgânicos na agricultura.
Mini-hídricas para Electrificação Rural: Pequenas centrais hidroeléctricas podem abastecer propriedades agrícolas e comunidades rurais. Estudos de Smil (2010) mostram que as mini-hídricas são altamente eficientes para electrificação descentralizada.
Essas soluções exigem políticas de financiamento acessíveis e capacitação dos agricultores, garantindo uma transição energética eficiente no sector rural.
4. Hotelaria: Eficiência Energética e Energias Renováveis
O sector hoteleiro, essencial para o turismo em Angola, também deve reduzir a dependência do gasóleo. Algumas estratégias incluem:
Aquecimento Solar de Água: Segundo Kalogirou (2004), sistemas solares térmicos podem reduzir em até 70% os custos energéticos dos hotéis, tornando-os mais sustentáveis.
Energia Eólica e Solar: O aproveitamento do potencial solar e eólico pode substituir geradores a diesel. De acordo com Lund (2014), a integração de múltiplas fontes renováveis garante maior estabilidade no fornecimento de energia.
5. Transporte Público e Privado: Mobilidade Sustentável e Redução de Custos
O sector dos transportes será um dos mais impactados pelo aumento do preço do gasóleo, pois grande parte dos autocarros, camiões e viaturas particulares ainda dependem desse combustível. Para garantir uma transição sustentável, algumas soluções podem ser adoptadas:
Autocarros e Táxis a Gás Natural (GNV): O uso de gás natural veicular pode reduzir os custos operacionais do transporte público, além de diminuir as emissões de poluentes. Estudos de Sperling & Gordon (2009) mostram que o GNV é uma alternativa viável para frotas urbanas.
Electrificação da Mobilidade: A implementação de autocarros eléctricos e incentivos para viaturas eléctricas pode ser uma solução de longo prazo. Segundo BloombergNEF (2022), a redução dos custos das baterias e a expansão da infraestrutura de carregamento são fundamentais para o sucesso da mobilidade eléctrica.
Expansão e Modernização do Transporte Ferroviário: Investir na reabilitação e expansão das linhas férreas pode reduzir a dependência do transporte rodoviário, promovendo eficiência energética e sustentabilidade (Banister, 2008).
Políticas de Mobilidade Sustentável: Incentivos fiscais para veículos eléctricos, criação de corredores exclusivos para transporte público e estímulo ao uso de bicicletas e soluções de mobilidade partilhada podem reduzir a pressão sobre o consumo de combustíveis fósseis.
A implementação dessas soluções requer políticas públicas bem estruturadas, parcerias entre o governo e o sector privado, além de investimentos em infraestrutura para garantir uma transição energética eficiente e sustentável no transporte.
6. Geração de Energia Eléctrica: Expansão das Energias Renováveis
O sector eléctrico angolano ainda depende de centrais térmicas a gasóleo e geradores a diesel em áreas isoladas. Para diversificar a matriz energética, algumas alternativas incluem:
Centrais Solares e Mini-redes Fotovoltaicas: Permitem a electrificação de comunidades remotas sem necessidade de geradores a diesel (IEA, 2023).
Energia Eólica: Segundo Jacobson et al. (2015), Angola possui grande potencial para geração eólica, especialmente nas regiões costeiras.
Expansão do Gás Natural para Geração de Energia: De acordo com Stern (2017), o gás natural pode ser uma alternativa viável de transição, reduzindo os custos de geração de energia.
Armazenamento de Energia e Baterias: O avanço nas tecnologias de armazenamento pode tornar o sistema eléctrico mais fiável e independente do gasóleo (IEA, 2023).
Conclusão: Um Caminho Necessário para o Desenvolvimento Sustentável
A remoção dos subsídios e o aumento do preço do gasóleo impõem desafios de curto prazo, mas representam uma oportunidade estratégica para a modernização da economia angolana. A substituição gradual do gasóleo por fontes energéticas mais eficientes e sustentáveis pode reduzir custos operacionais, aumentar a competitividade e garantir maior segurança energética.
Como defende Lovins (2011), a transição energética não deve ser encarada como um fardo, mas como uma oportunidade para inovação e crescimento sustentável. Angola tem o potencial de liderar essa mudança, garantindo um futuro económico mais próspero e ambientalmente responsável.
José Monteiro
25/03/2025 em 6:24 am
É melhor um preço justo para o gasóleo do que alimentar as negociatas deste entre fronteiras e assim em vez de beneficiar meia dúzia, poderá prestar bom desempenho noutros sectores