Crónica
Da África do Sul racista ao Chega: alianças que comprometem a UNITA

A participação de jovens da JURA numa formação organizada pelo partido português Chega não pode ser entendida como um simples exercício de intercâmbio cultural ou técnico, conforme defendeu a própria organização no comunicado tornado público em reação às repercussões negativas da sua investidura.
Em política, não existem formações neutras. Quem aprende, aprende com base em valores, métodos e visões de mundo que reflectem a ideologia da entidade que promove o encontro. Por isso, ao aceitar a mão do Chega, os jovens da UNITA alinham-se, ainda que simbolicamente, com um partido de extrema-direita que se encontra em clara contradição com a linha internacional da própria UNITA.
A UNITA ocupa uma das vice-presidências do Internacional Democrata Centrista (IDC), uma plataforma de partidos democratas-cristãos e de centro-direita moderada. Em Portugal, o parceiro natural desta aliança é o Partido Social Democrata (PSD), e não o Chega. Qualquer aproximação a forças ideologicamente antagónicas soa, no mínimo, a irresponsabilidade política. Mais do que um “exercício de abertura ao mundo”, como diz a JURA, é um sinal de desorientação estratégica ou, pior ainda, de pragmatismo calculado.
E aqui entra a memória da história. Não é a primeira vez que a UNITA demonstra esta disposição de se aproximar de aliados controversos quando convém. Durante a guerra civil, não hesitou em receber apoio dos racistas sul-africanos do regime do apartheid, facilitando invasões em território nacional. Hoje, a retórica pode ter mudado, mas a prática parece manter-se: associar-se a quem for útil, mesmo que isso custe coerência e credibilidade.
O comunicado da JURA, ao invés de acalmar receios, acabou por confirmar aquilo que muitos já sabiam. A UNITA não mede meios quando se trata de defender os seus interesses. Essa cultura política de pragmatismo absoluto, ontem com o apartheid, hoje com o Chega, fragiliza a imagem de quem se apresenta como alternativa de poder em Angola.