Análise
Chega de experiência, Angola precisa de liderança com visão!
Num mundo onde a tecnologia avança a passos largos e os recursos naturais já não garantem o sucesso económico de um país, a qualidade da liderança tornou-se o principal diferencial entre o fracasso e o progresso de uma nação. Angola, com todas as suas potencialidades geográficas, demográficas e culturais, encontra-se numa encruzilhada histórica: ou investe na transformação das suas lideranças ou continuará refém da estagnação institucional, da desmotivação da juventude e da incapacidade crónica de realizar os seus planos.
É neste contexto que emerge a necessidade inadiável de compreender e aplicar, com intencionalidade política e social, o conceito de soft skills, as chamadas habilidades humanas e comportamentais da liderança.
1. O que são soft skills e por que importam?
As soft skills são competências não-técnicas que dizem respeito ao comportamento humano em contexto social e organizacional. Envolvem desde a empatia, comunicação eficaz, resolução de conflitos, até à liderança emocional, colaboração e pensamento crítico. Para Daniel Goleman, psicólogo e autor da teoria da inteligência emocional,
“O que distingue os líderes excelentes dos medianos não é o QI, mas sim o QE — a inteligência emocional.” (Goleman, 1995)
Em outras palavras, não basta saber fazer, é preciso saber liderar pessoas com respeito, sensibilidade e propósito.
Num país como Angola, onde grande parte das decisões governamentais, empresariais e institucionais impacta directamente a vida de comunidades vulneráveis, o exercício da liderança sem soft skills é como navegar um barco sem bússola: pode até ter motor, mas não tem direcção.
2. Lições globais e africanas de liderança visionária
A história recente mostra que os países que apostaram em líderes com visão humanista e habilidades sociais bem desenvolvidas alcançaram resultados significativos. Um dos exemplos mais emblemáticos é o de Singapura, liderada por Lee Kuan Yew, que afirmou categoricamente:
“A minha prioridade sempre foi investir nas pessoas. Um Estado forte precisa de uma população forte.” (Lee Kuan Yew, 2000)
Em Ruanda, Paul Kagame reconstruiu um país devastado pela guerra apostando numa liderança centrada na escuta activa, empoderamento das mulheres e promoção de talentos locais, tornando Ruanda um dos países mais eficientes e inovadores do continente. Segundo Kagame:
“Liderar é servir. E para servir é preciso escutar.” (Kagame, 2014)
Botswana, um caso de estabilidade política rara em África, consolidou uma cultura de governação meritocrática e ética sob o comando de Seretse Khama, que dizia:
“O valor de um país está no valor dos seus líderes.”
Estes líderes têm algo em comum: sabiam inspirar, ouvir, corrigir sem humilhar, tomar decisões difíceis sem perder a humanidade, em suma, possuíam soft skills elevadas.
3. Renovação geracional e o desafio da liderança com soft skills em Angola
A recente declaração do Presidente da República de Angola, João Lourenço, em entrevista à CNN Portugal, reacendeu o debate nacional sobre o perfil ideal para o futuro Chefe de Estado, num momento em que o país enfrenta grandes desafios económicos, sociais e institucionais. Ao evocar o exemplo do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, que assumiu a liderança aos 37 anos em 1979, Lourenço defendeu uma renovação geracional, sugerindo que Angola está pronta para ser liderada por um jovem preparado, à semelhança do que aconteceu com “Zé Dú”.
“Hoje temos igualmente, não um, dois, três… temos jovens que estarão, quando chegar o momento, em condições e preparados de todos pontos de vista a assumir as rédeas da governação de Angola.” – João Lourenço, CNN Portugal, 2024
Essa afirmação tem provocado ampla reflexão na sociedade civil e entre analistas políticos, que apontam para a necessidade de a renovação não ser apenas geracional, mas também cultural, ética e comportamental. Ou seja, não basta ser jovem, é essencial que o futuro líder tenha a capacidade de comunicar com empatia, ouvir as aspirações do povo, trabalhar em equipa e inspirar confiança, competências que só são possíveis com uma sólida formação em soft skills de liderança.
A discussão vai além da idade ou da origem partidária. Como bem afirmou Barack Obama:
“A mudança não virá se esperarmos por outra pessoa ou por outro momento. Somos nós por quem estávamos à espera. Somos a mudança que procuramos.” (Obama, 2008)
Este é o momento para Angola redefinir a sua ideia de liderança: menos autoritarismo e mais inteligência emocional; menos carisma de palanque e mais competência de diálogo; menos figura de comando e mais espírito de serviço público.
4. A realidade angolana: hard skills não bastam
Em Angola, há um padrão repetitivo no qual os líderes são avaliados apenas pela sua formação académica, filiação partidária ou capacidade de comando, ignorando a maturidade emocional, a humildade intelectual e a capacidade de dialogar com a diferença.
A falta de soft skills está presente na incomunicabilidade entre governantes e governados, na burocracia insensível, no autoritário em vez do colaborativo, e no medo de delegar e partilhar poder. Como lembra Peter Senge, autor de A Quinta Disciplina,
“As organizações fracassam não por falta de visão, mas por incapacidade de aprender juntas.” (Senge, 1990)
É este o desafio de Angola: não basta escrever estratégias; é preciso criar líderes que saibam colocá-las em prática com espírito de equipa, sensibilidade social e ética relacional.
5. Oportunidade estratégica para Angola
Com a chegada das autarquias locais, a transição para uma economia mais diversificada, e a necessidade de engajar os jovens e mulheres na construção do país, Angola tem agora a oportunidade de formar uma nova geração de líderes com soft skills fortes.
Para isso, é fundamental que:
As escolas de formação de quadros integrem disciplinas de liderança emocional, comunicação interpessoal, ética pública e cultura de paz;
Os partidos políticos revejam os seus métodos de selecção de candidatos, privilegiando não apenas a militância, mas também a capacidade de dialogar e representar com humanidade;
As empresas públicas e privadas invistam em lideranças inclusivas, colaborativas e focadas no bem-estar dos seus trabalhadores;
A função pública seja reformada para valorizar o mérito, a escuta activa e o serviço ao cidadão como missão.
6. Porquê começar pelas lideranças?
Segundo John Maxwell, especialista em liderança,
“Tudo sobe ou desce com a liderança.” (Maxwell, 2007)
Isso significa que, em qualquer país, a qualidade das decisões, dos serviços e dos resultados sociais será sempre proporcional à qualidade humana de quem lidera.
Sem soft skills, os planos mais ambiciosos são sabotados pela arrogância, pela insensibilidade ou pela má comunicação.
7. Conclusão: O desafio do futuro é humano
Angola precisa urgentemente de cultivar uma cultura de liderança baseada na empatia, na escuta, na colaboração e na inteligência emocional. Isso é válido tanto para o ministro como para o administrador municipal; tanto para o empresário quanto para o director de escola. O país que queremos construir começa na pessoa que escolhemos ser como líderes.
Mais do que um conjunto de projectos, Angola precisa de um projecto de humanização da liderança. E isso começa com uma simples, mas poderosa escolha:
liderar com o coração e com a razão, ao mesmo tempo.
Fernando Mateus Carvalho
04/08/2025 em 11:43 pm
Gostei muito do conteúdo do texto
Valdemar Vieira Dias
06/08/2025 em 2:12 am
“Liderança é comportamento, não hierarquia.” – VVD.
Excelente artigo. Parabéns.