Ligar-se a nós

Dinheiro Inteligente

A Marca Angola existe ou é um produto sem embalagem?

Publicado

em

“Na ausência de uma narrativa clara, outros contarão a tua história — à sua maneira.” — Simon Anholt, criador do conceito de Nation Branding

1. Introdução: o país que ninguém sabe vender

Angola tem petróleo, diamantes, florestas tropicais, fauna selvagem, uma costa magnífica, uma cultura riquíssima, uma juventude criativa e uma história de resistência. Mas, apesar de tudo isso, continua a ser invisível no mercado global das marcas nacionais. O que o mundo conhece de Angola, quando conhece, é através das notícias sobre corrupção, pobreza, instabilidade ou ostentação desenfreada.

A pergunta é inevitável: qual é a Marca Angola? O que representa Angola no imaginário global? E, mais grave ainda: os próprios angolanos sabem responder a essa pergunta?

2. Marca-país: mais que logótipos, trata-se de identidade

Uma marca nacional não é um slogan bonito com um logótipo colorido para exibir em feiras internacionais. Não é um vídeo institucional com música épica e imagens de crianças sorridentes. Uma marca-país é a percepção colectiva e sustentada que o mundo, e os próprios cidadãos, têm de um território. É uma reputação construída com base em práticas consistentes, símbolos fortes e acções visíveis.

Simon Anholt, referência mundial em marketing de nações, afirma: “a marca de um país é aquilo que as pessoas pensam quando ouvem o seu nome.”

E quando o mundo ouve “Angola”, pensa em quê?

3. Angola: um produto bruto, sem narrativa estruturada

Angola tem tudo para ser uma marca forte: beleza natural autêntica, povos acolhedores, música poderosa, gastronomia marcante, artesanato original e uma posição geoestratégica invejável. Mas falta-lhe uma narrativa coordenada, tanto no plano interno como externo.

Não há uma política nacional clara de branding institucional.

Não há integração entre os sectores da diplomacia, cultura, turismo e economia.

Os eventos de promoção internacional são dispersos, descoordenados e muitas vezes incongruentes com a realidade local.

Os próprios cidadãos não são embaixadores da sua cultura, porque não foram ensinados a valorizá-la de forma consciente.

Resultado? Angola é um produto por embalar, rico em conteúdo mas pobre em apresentação.

4. Quando a identidade é improvisada: os riscos do marketing político

Em vez de construir uma Marca Angola sólida, institucional e duradoura, os sucessivos governos tentaram associar a imagem do país à imagem dos seus líderes. A figura do presidente ou do partido no poder é confundida com o país, o que compromete a estabilidade da marca, que fica vulnerável às crises políticas internas.

Esse é um erro crasso. As grandes marcas nacionais, como “Portugal dos Descobrimentos”, “Brasil da Alegria”, “Japão da Inovação” ou “África do Sul do Ubuntu”, foram construídas para além dos governos, com envolvimento de toda a sociedade.

Como alertava Philip Kotler, “quando o marketing é dominado pela política, a marca perde autenticidade.”

5. Construir a Marca Angola: caminhos possíveis

Para que Angola possa finalmente ocupar o seu lugar no mapa das nações com reputação estratégica, é necessário abandonar o improviso e adoptar uma abordagem integrada de construção de marca. Eis algumas propostas concretas:

a) Criar uma Agência Nacional de Marca Angola: Uma entidade pública-privada, multidisciplinar, encarregue de coordenar a imagem do país dentro e fora de portas, envolvendo os sectores do turismo, cultura, diplomacia, economia e juventude.

b) Definir os Pilares da Identidade Angolana: Quais são os valores que Angola quer comunicar? Hospitalidade? Resiliência? Riqueza cultural? Potencial económico? Ecoturismo? A identidade precisa de pilares sólidos e coerentes.

c) Formar os cidadãos como embaixadores: Integrar conteúdos de valorização cultural nos currículos escolares. Promover concursos, campanhas e festivais que reforcem o orgulho nacional e a consciência da nossa diversidade.

d) Reformar a diplomacia cultural: As embaixadas não devem ser apenas espaços políticos, mas centros de irradiação da cultura angolana: com exposições, eventos musicais, mostras de cinema e intercâmbios criativos.

e) Comunicar com consistência: A Marca Angola deve estar presente em todas as esferas: dos passaportes aos produtos de exportação, das plataformas digitais à publicidade institucional. Coerência é chave.

6. Conclusão: ser ou parecer? Eis a questão nacional

Não basta ter riquezas. É preciso saber contá-las. Não basta ter história. É preciso saber comunicá-la. Não basta existir. É preciso marcar presença no imaginário colectivo mundial.

A Marca Angola ainda está por nascer, ou, pelo menos, por ser organizada. Neste momento, somos um diamante por lapidar, um país que ainda não aprendeu a apresentar-se ao mundo com a força da sua identidade e a elegância da sua diversidade.

Mas ainda vamos a tempo.

Porque uma Nação sem marca é uma Nação sem voz. E quem não tem voz, será sempre contado pelos outros, muitas vezes de forma injusta.

Denílson Adelino Cipriano Duro é Mestre em Governação e Gestão Pública, com Pós-graduação em Governança de TI. Licenciado em Informática Educativa e Graduado em Administração de Empresas, possui uma sólida trajectória académica e profissional voltada para a governação, gestão de projectos, tecnologias de informação, marketing político e inteligência competitiva urbana. Actua como consultor, formador e escritor, sendo fundador da DL - Consultoria, Projectos e Treinamentos. É autor de diversas obras sobre liderança, empreendedorismo e administração pública, com foco em estratégias inovadoras para o desenvolvimento local e digitalização de processos governamentais.

Continuar a ler
Clique para comentar

Deixar uma resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Publicidade

Radio Correio Kianda

Publicidade




© 2017 - 2022 Todos os direitos reservados a Correio Kianda. | Este material não pode ser publicado, transmitido por broadcast, reescrito ou redistribuído sem prévia autorização.
Ficha Técnica - Estatuto Editorial RGPD