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Análise

A contabilidade nacional como pilar para avaliação e planeamento económico de Angola

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A Contabilidade Nacional não é apenas um conjunto de registos estatísticos, mas um sistema estruturado de informação que traduz a dinâmica da economia em números e indicadores. O seu principal objectivo é fornecer à sociedade subsídios concretos para uma avaliação macroeconómica rigorosa, reconhecendo a produção das empresas, o consumo das famílias e os investimentos realizados num determinado período.

Segundo Horngren, Foster e Datar (2000), a contabilidade deve fornecer informações úteis para a formulação de estratégias de longo prazo, a alocação de recursos, o controlo de custos e a avaliação de desempenho, bem como para cumprir exigências legais de divulgação. Estes princípios validam a importância de entender tanto o que produzimos como o que consumimos e investimos ao nível macroeconómico.

No caso de Angola, onde a economia enfrenta desafios como a dependência do petróleo, os esforços de diversificação e as instabilidades externas, os relatórios da Contabilidade Nacional funcionam como um “mapa de navegação” para decisores, investidores e cidadãos.

Uma contribuição essencial da contabilidade é permitir identificar como os investimentos são financiados, seja por poupança interna, capital externo ou dívida pública, o que é fundamental para políticas sustentáveis e uma gestão equilibrada dos recursos.

Adicionalmente, este sistema quantifica as remunerações pelos factores de produção, salários, juros, lucros e rendas, revelando como a riqueza é distribuída. Em contextos de desigualdade, como o de Angola, isso pode indicar se o crescimento beneficia realmente as famílias ou apenas uma minoria.

Além disso, conforme observam Esnault e Horau (1994), a contabilidade cumpre uma função social crucial: fornecer confiança nas transacções e legitimar decisões e acordos entre diferentes actores, facilitando o diálogo mesmo em contextos de interesses contraditórios. Ou seja, a contabilidade é uma ferramenta essencial não apenas para medir, mas sobretudo para orientar e legitimar decisões económicas e sociais.

A Contabilidade Nacional no Contexto da Administração Local do Estado

A Contabilidade Nacional, embora tradicionalmente associada à avaliação macroeconómica de um país, também desempenha um papel determinante para o planeamento e a gestão económica das administrações locais do Estado. Governos provinciais e administrações municipais, enquanto entidades responsáveis pela execução de políticas públicas mais próximas do cidadão, dependem de dados fiáveis e actualizados para orientar decisões que impactam directamente o desenvolvimento territorial.

No nível local, os indicadores macroeconómicos nacionais devem ser desagregados em dados regionais e municipais, permitindo aos administradores compreender o seu peso relativo na economia nacional e identificar as áreas de maior potencial produtivo. Esta leitura territorial da economia contribui para:

1. Planeamento orçamental mais realista – Ao cruzar as estatísticas nacionais com a realidade fiscal e produtiva local, as administrações podem definir metas de receita e despesa alinhadas com a sua capacidade económica.

2. Apoio à diversificação económica – Em municípios com economia excessivamente dependente de um único sector, a informação macroeconómica adaptada ao contexto local pode orientar programas de incentivo a novas actividades produtivas, atraindo investimento e gerando emprego.

3. Avaliação de impacto de políticas públicas – A Contabilidade Nacional fornece um quadro de referência para medir os efeitos das acções municipais no rendimento das famílias, na geração de postos de trabalho e na melhoria da infraestrutura económica.

Segundo Rezende (2010), a descentralização administrativa só atinge a sua eficácia plena quando acompanhada de instrumentos de planeamento e avaliação baseados em dados concretos. Assim, a aplicação prática da Contabilidade Nacional ao nível local exige mecanismos de cooperação entre o Instituto Nacional de Estatística, o Banco Nacional de Angola, os governos provinciais e as administrações municipais, para que os dados nacionais sejam convertidos em informação útil para decisões regionais.

Além disso, ao incorporar estes indicadores nos processos participativos, como os conselhos de auscultação social, garante-se que as comunidades compreendam melhor a situação económica do seu território e participem activamente na definição de prioridades. Esta prática fortalece a governação local e aumenta a confiança nas instituições.

Portanto, a Contabilidade Nacional, quando devidamente territorializada, deixa de ser um recurso restrito a órgãos centrais do Estado e passa a ser uma ferramenta estratégica para a Administração Local, assegurando que o desenvolvimento económico se faça de forma equilibrada, inclusiva e sustentável em todo o país.

Como o cidadão angolano pode compreender e usar estes dados?

A compreensão e o aproveitamento da Contabilidade Nacional pelo cidadão angolano dependem de três transformações estruturais:

1. Acesso simplificado à informação: Apesar de o Instituto Nacional de Estatística (INE) e o Banco Nacional de Angola (BNA) publicarem relatórios, estes são frequentemente técnicos e pouco acessíveis. Devem ser produzidas versões resumidas, ilustradas, com gráficos claros, linguagem simples e amplamente divulgadas através da rádio, da televisão, das redes sociais e em línguas nacionais, para garantir maior alcance.

2. Educação económica: Sem noções básicas de economia, torna-se difícil relacionar os números com a vida quotidiana. É urgente incluir Educação Financeira e Económica nos currículos escolares, promover acções de capacitação em comunidades e fomentar debates públicos, onde especialistas expliquem, com exemplos práticos, como esses dados influenciam salários, preços e emprego.

3. Transparência e utilidade prática: Os cidadãos valorizam dados apenas quando percebem que resultam em acções concretas. É necessário que o Governo explique como a informação estatística fundamenta as políticas públicas, estabeleça canais de prestação de contas e demonstre, por exemplo, como irá responder à queda dos salários ou ao aumento da inflação.

Síntese e importância para Angola

Apesar da sua importância, a Contabilidade Nacional ainda é pouco compreendida pela população angolana. Todavia, a situação pode mudar se houver empenho em transformar dados técnicos em informação acessível e relevante, promovendo uma cultura de cidadania informada e exigente.

Em países desenvolvidos, os dados macroeconómicos integram o debate público, influenciando decisões eleitorais, empresariais e sociais. Angola deve seguir esse modelo, tornando as estatísticas não apenas transparentes, mas também compreensíveis e aplicáveis.

Em síntese, a Contabilidade Nacional não é um mero requisito burocrático, é um instrumento estratégico essencial para políticas económicas esclarecidas e para o desenvolvimento social sustentável. Ignorá-la é caminhar no escuro; valorizá-la de forma inteligente significa acender luzes no caminho de um futuro mais próspero para todos.

Denílson Adelino Cipriano Duro é Mestre em Governação e Gestão Pública, com Pós-graduação em Governança de TI. Licenciado em Informática Educativa e Graduado em Administração de Empresas, possui uma sólida trajectória académica e profissional voltada para a governação, gestão de projectos, tecnologias de informação, marketing político e inteligência competitiva urbana. Actua como consultor, formador e escritor, sendo fundador da DL - Consultoria, Projectos e Treinamentos. É autor de diversas obras sobre liderança, empreendedorismo e administração pública, com foco em estratégias inovadoras para o desenvolvimento local e digitalização de processos governamentais.

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