Crónica
Cancelamento 2.0: C4 Pedro mostra que talento não se exorciza
Em pleno século XXI, onde um post vale mais do que um diploma e um trend se confunde com sentença, houve quem jurasse que C4 Pedro estava à beira do cancelamento digital. Não por desafinar, não por crise criativa, mas porque decidiu, por vontade própria, assumir um pseudónimo ancestral: Nzamba N’kunku Mpetelo Messami e ter posicionamento a quando da filantropia influencers. E isso, para alguns comentaristas de sofá e teólogos de Facebook, já era prova suficiente de “acomunação com forças ocultas”… Também “EU”, entrei neste chinguilamento cibernético. Afinal, quando o artista africano reivindica símbolos próprios, a internet entra em modo pânico espiritual.
O detalhe deliciosamente ignorado é que ninguém lhe colou esse nome. Foi ele quem o afirmou, quem o disse em palco, quem o carregou com intenção simbólica e cultural. Mas, como manda a cartilha do linchamento digital, a autoria não interessa; o que interessa é o escândalo. E lá vieram as análises místicas de ocasião, feitas por gente que nunca tremeu ao ouvir um batuque, mas treme de medo quando vê identidade africana assumida sem pedir autorização.
Enquanto isso, bastava olhar para o caso do “Putu Português”, que enfrentou críticas, boatos e ameaças de cancelamento digital, mas não soube proteger a sua marca pessoal. Resultado: o público rapidamente confundiu polémica com identidade, e a reputação ficou fragilizada. Se o Putu tivesse aprendido com C4 Pedro, talvez tivesse percebido que assumir o controlo da própria narrativa e cultivar autenticidade é a única imunidade real contra o linchamento das redes.
Veio então o momento inconveniente para os profetas do cancelamento: o show de C4 Pedro. Em palco, não invocou espíritos, invocou aplausos; não lançou feitiços, lançou êxitos. A multidão respondeu com aquilo que os algoritmos não sabem processar: presença real, coro colectivo e emoção autêntica. Ficou claro que, se há alguma “força” ali, ela chama-se carreira construída, não magia negra.
Como se não bastasse, o próprio artista ainda publicou, com ironia silenciosa, a fotografia da viagem “cavalgando numa vassoura” para Cabinda. Nada de justificações, nada de pedidos de desculpa. E o povo, esse que não confunde cultura com superstição, respondeu com maturidade: chamou-o pelo pseudónimo que ele próprio escolheu, não como acusação, mas como reconhecimento. O que era suposto ser polémica virou celebração.
No fundo, tudo isto não passa de um caso clássico de marketing pessoal autêntico. Daquele que não se aprende em cursos rápidos de “gestão de crise digital”. C4 Pedro fez exactamente o que marcas fortes fazem: assumiu quem é, não recuou e seguiu em frente. Exactamente como Puff Daddy, que virou P. Diddy e depois apenas Diddy, sem jamais pedir bênção aos guardiões morais da internet.
Conclusão inevitável e amarga para os críticos, e uma lição que o Putu Português devia ter aprendido: não se cancela quem controla a própria narrativa. E muito menos quem tem público, palco e história. C4 Pedro mostrou que, entre rumores digitais e identidade assumida, vence sempre quem sabe proteger a própria marca e cultivar autenticidade.
