Análise
A arte da sucessão de CEO: entre o ego e a responsabilidade dos conselhos
1. Sucessão de CEO: um imperativo de governação
A sucessão de CEO (Chief Executive Officer) é, como defende Tichy (2014), uma das tarefas mais críticas para a sobrevivência de qualquer organização. Não se trata apenas de substituir um dirigente; trata-se de garantir continuidade estratégica, estabilidade institucional e capacidade de adaptação num mercado em constante mudança.
Segundo Drucker (1999), considerado o pai da gestão moderna, “não há decisão mais importante para uma organização do que a escolha dos seus líderes”. Falhar nesta responsabilidade é comprometer o presente e hipotecar o futuro.
2. O erro da impreparação
Tichy (2014) denuncia que muitos conselhos de administração são apanhados de surpresa quando um CEO abandona o cargo inesperadamente, deixando a organização sem sucessor preparado. Ele compara esta situação à de “um carro sem pneu suplente”.
Dados revelam que 40% dos conselhos admitem não estar preparados para uma sucessão de emergência. Isto confirma a crítica de Kotter (2012), para quem “a ausência de planeamento sucessório é uma das causas silenciosas de colapso organizacional”.
Em Angola, este cenário é recorrente. Mudanças súbitas em bancos, empresas públicas ou ministérios revelam uma falta estrutural de preparação de sucessores, o que resulta em improvisações, vazios de liderança e instabilidade institucional.
3. O risco dos planos “SPOTS”
Outro problema identificado é a proliferação dos chamados planos SPOTS (Succession Plans On Top Shelves) – documentos elaborados apenas para formalidade, que nunca chegam a ser aplicados.
Ram Charan (2005), um dos maiores especialistas em liderança e parceiro intelectual de Tichy, chama a este fenómeno “ilusão de planeamento”, em que o papel substitui a ação. Mintzberg (1994) já alertava que “planos estratégicos guardados em gavetas não criam estratégias vivas, apenas burocracias mortas”.
Na prática, a sucessão exige processos dinâmicos, interação real com candidatos e acompanhamento contínuo, não rituais anuais de avaliação superficial.
4. A tentação de dividir o poder
Muitos conselhos optam por dividir as funções de Presidente e CEO para conter líderes autoritários. Porém, Tichy (2014) defende que tal solução raramente resulta: “as organizações funcionam melhor com um líder claro, não com dois ou três”.
Jim Collins (2001), no clássico Good to Great, acrescenta que “as empresas de excelência constroem-se com líderes humildes mas firmes, e não com estruturas artificiais para equilibrar egos”. O problema não está na arquitetura do cargo, mas sim na falta de coragem do conselho em substituir líderes inadequados.
5. As boas práticas de sucessão
Apesar dos riscos, há práticas eficazes identificadas por Tichy e Knowling, que encontram respaldo em outros autores:
Coaching executivo – Líderes em potencial devem ser acompanhados por mentores que os ajudem a desenvolver competências. Goleman (1998) sublinha que a inteligência emocional é decisiva na liderança, algo que só se aperfeiçoa com treino.
Exposição justa a todos os candidatos – Criar contextos formais e informais (reuniões, jantares, conversas abertas) é essencial. Segundo Bennis (2009), “a liderança revela-se tanto em salas de reuniões como em mesas de jantar”.
Participação em outros conselhos – Dar experiência externa a candidatos amplia horizontes e redes de contacto. Charan, Carey e Useem (2010) argumentam que “líderes preparados são aqueles expostos a múltiplos contextos de decisão”.
Estas práticas constroem linhas de sucessão fortes e reduzem riscos de crises futuras.
6. O obstáculo maior: o ego dos CEOs de sucesso
O maior inimigo do planeamento sucessório, afirma Tichy, é o ego dos CEOs em alta. Quando os números sobem e as ações disparam, o conselho hesita em questionar. Surge o chamado “efeito halo”, em que resultados financeiros encobrem falhas de governação.
Bob Knowling é categórico: “a maioria dos CEOs são egomaníacos – é assim que chegam ao topo”. Collins (2001) contrapõe com a noção de “líder nível 5”, aquele que combina humildade pessoal com determinação profissional. O problema é que, como alerta Kotter (2012), “os conselhos preferem muitas vezes adorar os líderes carismáticos em vez de disciplinar os líderes egocêntricos”.
Em Angola, esta situação é visível em grupos empresariais familiares e empresas públicas, onde o poder se concentra em figuras carismáticas que não preparam sucessores. O resultado é a fragilidade estrutural e a instabilidade sempre que ocorre uma transição.
7. Reflexões para Angola
Transportando estas lições para Angola, torna-se evidente que a cultura de sucessão é ainda frágil.
Nas empresas familiares, a sucessão é frequentemente marcada por conflitos entre herdeiros, transformando-se numa batalha de interesses em vez de ser um processo estratégico.
No setor público, muitos dirigentes permanecem décadas nos cargos, sem nunca preparar substitutos. O resultado é previsível: instabilidade, perda de eficiência e quebra de confiança pública.
Santos (2016), ao estudar governação africana, refere que “a ausência de sucessão estruturada nas instituições africanas é uma das causas centrais da fragilidade do Estado e das empresas”.
Finalmente, é importante reconhecer que a sucessão de CEO não é um luxo, é um imperativo de boa governação. Exige coragem para enfrentar egos inflados, disciplina para transformar planos em prática e visão para investir em talentos emergentes.
Como afirma Drucker (1999), “a primeira tarefa de um líder é garantir novos líderes”. E como reforça Tichy (2014), “o planeamento sucessório não é opcional – é a essência da continuidade organizacional”.
Em Angola, se quisermos construir empresas e instituições resilientes, devemos investir numa cultura de sucessão clara, transparente e estratégica. Só assim será possível ultrapassar o personalismo e assegurar continuidade no desenvolvimento económico e social.
Porque, como recorda o lema dos escuteiros, citado por Tichy: “Estejam preparados!”