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Análise

Visita de Antony Blinken a África visa reafirmar e reforçar parcerias

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O continente berço continua a ser, à semelhança do período da guerra-fria, um campo de disputas político-diplomáticas entre as grandes potências mundiais, que buscam apoio para esvaziar outro. E é neste quadro que Moscovo, a mais robusta potência nuclear planetária, agenda organizar uma cimeira no coração do continente, e Washington destaca já para este mês o terceiro homem mais importante da Administração Biden, que vem assegurar que os compromissos assumidos pelo país são para ser cumpridos, e pedir mais acções concretas que visem isolar o velho rival.

A reafirmação do compromisso de prosperidade mútua com base em investimento governamental e empresarial norte-americano, a modernização dos sistemas de segurança e de defesa, bem como a busca de garantia de partilha de valores na arena internacional, estão entre as motivações da visita que Antony Blinken, secretário de Estado dos Estados Unidos da América (EUA), fará a quatro países do continente africano.

Como já noticiámos na tarde de ontem com base numa informação tornada pública pela Embaixada dos EUA em Angola, o terceiro homem mais importante do governo de Joe Biden visita ainda este mês a Nigéria, Costa do Marfim, Cabo-Verde, todos membros da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), e Angola, que lidera a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), esta última uma região com mais de 290 milhões de habitantes, e um PIB estimado em 1,52 trilião de dólares.

A escolha desses países para o périplo de Antony Blinken não é aleatório, resulta de sua relevância no panorama político e diplomático no continente, associado ao facto de terem total ou parcialmente virado costas à Rússia, por esta ter militarmente invadido e anexação de territórios ucranianos.

Por exemplo, Angola, com 49 anos de independência, foi durante pouco mais de três décadas e meia, um dos mais importantes aliados africanos da Rússia, um percurso histórico que acabou por conhecer uma ‘inversão de marcha’ com a invasão já enunciada, e os EUA tudo têm feito para que a relação privilegiada entre Luanda e Moscovo seja somente coisa do passado.

E sabe-se lá como, os norte-americanos têm somado pontos em relação a Angola, esta que, contra todas as expectativas, depois de em Março de 2022, antes da reeleição de João Lourenço como Presidente da República, ter votado por abstenção na ONU, a um projecto que visava condenar a Rússia por invadir a Ucrânia em Fevereiro daquele ano, passou a votar a favor de qualquer resolução que tem como objectivo expor negativamente a opção de Mosco e seu presidente Vladimir Putin.

E Joe Biden, presidente norte-americano, manifesta-se regozijado por esta conquista estratégica de sua Administração, tendo o próprio afirmado publicamente que Angola é, para os EUA, a Nação mais importante de África. Mas, os russos, avisam Luanda com o argumento de que poderá arrepender-se da parceria agora selada com Washington, apontando falta de compromisso sincero por parte dos dirigentes americanos.

Porém, até aqui, a Casa Branca tem, pelo menos no quadro da prosperidade social, que passa pela garantia de investimentos, quer governamental, quer empresarial, cumprido gradualmente com os diferentes acordos. Há presença significativa norte-americana no Corredor do Lobito, um projecto com um importante centro logístico, e que liga por linha férrea o território angolano à Zâmbia e à República Democrática do Congo, podendo também ligar-se deste ponto para o Oceano Índico e cruzar a África do Sul e Moçambique, do qual os EUA já aprovaram um investimento de pouco mais de mil milhões de dólares, pelo menos até Setembro do ano passado. Além de, entre outras coisas, do investimento norte-americano na concepção de centros de energia limpa para Angola.

Projecto para afastar Luanda de Moscovo

Não é de hoje o plano dos EUA de afastar Angola da Rússia. Desde a independência em 1975, Angola é governada pelo partido MPLA, uma organização de matriz socialista, e que face à aproximação ideológica, sempre beneficiou do apoio directo e quase incondicional da Rússia, antes pela União Soviética.

E foi o apoio militar russo-cubano que levou o MPLA a resistir às investidas da UNITA que tinha o apoio militar da África do Sul e financeiro dos EUA. Entretanto, pragmáticos, os norte-americanos entenderam alterar o quadro de animosidade com o MPLA já no início de 1990, tendo o restabelecimento de relações formais ocorrido em 1993.

Naquele período, muitos nos EUA ainda manifestavam-se cépticos de que fosse possível alterar a relação Angola-Rússia a favor de uma parceria mais consolidada com os EUA, mas o então jovem Joe Biden, de acordo com registos, já defendia essa possibilidade, um facto que a Administração Trump procurou realizar entre 2018 e 2019, mas falhou por conta de sua falta de subtileza.

Entretanto, Joe Biden, que veio a substituir Donald Trump na presidência norte-americana, alcançou esse propósito em menos de dois anos do seu mandato que termina já este ano.

De forma inédita, o Governo angolano passou a criticar publicamente as opções de política internacional adoptada pela Rússia, tendo inclusive o Presidente angolano manifestado o desejo de mudar a ‘técnica militar’ angolana dominada por material bélico russo, por equipamentos da NATO, a organização Transatlântica liderada pelos EUA.

Países da CEDEAO

Na cimeira EUA-África, em 2022, a Administração Biden fez promessas de prosperidade de segurança, e à medida que vai investindo em Angola, o faz igualmente noutros países africanos, embora com a celeridade e empenho diferente. E a reafirmação do compromisso de prosperidade mútua com base em investimento governamental e empresarial, bem como a busca de garantia de partilha de valores na arena internacional, que Antony Blinken visita igualmente o Cabo-Verde, a Costa do Marfim e a Nigéria, importantes países da CEDEAO.

Por exemplo, a Costa do Marfim e os EUA têm desenvolvido uma relação que os norte-americanos consideram próspera, sobretudo na manifestação de valores internacionais, como a integridade territorial, não ingerência externa e entre outros. E isso mesmo o disse Antony Blinken, em Março de 2022, aquando da visita aos EUA do então primeiro-ministro costa-marfinense, Patrick Achi.

“Nós nos juntamos à Costa do Marfim na condenação global da invasão da Ucrânia pela Rússia”, dissera Antony Blinken, após uma reunião sobre crescimento económico e cooperação.

Da viagem aos EUA, Achi buscou maior parceria comercial, segurança e diplomacia. E a imprensa da Costa do Marfim garante mesmo que Blinken, com a viagem agendada para este mês, deverá levar ao país propostas mais concretas para o andamento de vários acordos e garantias.

Cabo-Verde, tido como um dos poucos actores com uma democracia consolidada, deseja alcançar com os EUA outro tipo de parceria baseada não muito para o comércio, mas na segurança e investimentos geradores de emprego.

Face à sua postura e valores muito próximos ao mundo ocidental, Praia tem, na ONU, adoptado uma posição que acabam por ser pró-ocidental, sobretudo em relação no conflito russo-ucraniano. A Nigéria, país liderado por Bola Tinubu, continua a ser um dos mais importantes parceiros comerciais dos EUA em África, mas também no quadro da segurança, um papel que ambos os países desejam preservar.

Portanto, é à volta das dificuldades e benefícios citados em que se circunscreve a visita de Antony Blinken a África.




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