Connect with us

Opinião

Reflectir sobre o Conceito Estratégico de Defesa Nacional

Published

on

Por: Daniel Lara
Mestrando em Relações Internacionais-Estudos de Segurança da Paz e da Guerra na Universidade Autonóma de Lisboa

Este artigo aborda a crescente mudança do panorama securitário global e a consequente necessidade de uma estratégia mais adequada com o fim de proteger o interesse nacional. No início do mandato passado foi aprovada, pelo Presidente da República, a revisão do Conceito estratégico de Defesa nacional, através do Decreto Presidencial 107/18.

De referir que o anterior CEDN datava de 1993.

Sem dúvida que, nos últimos anos, o contexto estratégico africano e global assim como o sistema internacional sofreram grandes mutações.

A guerra ao terror, a problemática da criminalidade organizada transnacional, o Brexit que remete a uma revisão da arquitetura de segurança europeia, a crise humanitária no mediterrâneo, a crise entre a República Democrática do Congo e o Ruanda, entre outros acontecimentos transnacionais complexos, são fatores de desestabilização de um sistema internacional cada vez mais contestado.

Angola sendo um Estado com um posicionamento estratégico relevante na África Austral e no continente africano, torna-se um player com elevada responsabilidade no seu espaço continental.

Desta forma, trazemos uma abordagem relativa aos instrumentos definidos para a condução da política de defesa e de outras que visam conduzir o país à consecução de objetivos nacionais, tendo em conta as condicionantes estruturais e conjunturais ao nível interno, regional e global. 

Tendo em conta a finalidade deste tipo de documento orientador (CEDN), a sua revisão levará à visão estratégica do país a amplitude que se requer, concedendo a todos os intervenientes da sociedade uma visão mais holística das ameaças e oportunidades.

Não poderia deixar de realizar uma pequena abordagem sobre o que é, de facto, um conceito estratégico. Em tese, à luz da Teoria da Estratégia, uma Estratégia é definida por um conjunto coerente e convergente de objetivos, linhas de ação e recursos, num exercício de harmonização interativa dessas três vertentes (General Luís Valença Pinto, 2022).

Desta forma, o presente artigo vem trazer uma breve reflexão, e procura responder à seguinte questão: Angola está mais bem servida com um CEDN ou com um Conceito Estratégico de Segurança Nacional?

O CESN constitui um documento orientador da grande estratégia nacional nos vários sectores críticos para o país. Desde a economia, a cultura, a segurança, segurança humana e ambiental, entre outros.

Entendemos que a estratégia militar já foi a essência dos mecanismos orientadores para a prossecução de vários objetivos, como a independência nacional e a garantia da paz. Contudo, olhando para o contexto atual, os desafios geopolíticos, econômicos, securitários e até culturais exigem uma visão mais ampla que não esteja tão vinculada à temática da defesa.

Angola não deixa de ser afetada, por exemplo, pela guerra na Ucrânia. Neste aspecto, recordamos que do ponto de vista da nossa segurança externa tiveram que ser socorridos vários estudantes naquele país. Por outro lado, do ponto de vista da segurança interna, a necessidade de garantir a segurança alimentar com uma Reserva estratégica que seja municiada a partir de recursos produzidos a nível nacional, reduzindo níveis de importação de forma a aumentar a autonomia estratégica.

A estratégia de segurança nacional, sendo ampla e abrangente a todos os sectores, deverá contemplar o caminho para chegar a uma capacidade de desenvolvimento tecnológico. Contempla, ainda, todo um conjunto de grandes fatores que remetem a princípios morais, culturais, de educação, da justiça, economia e ciência, não esquecendo a indústria, a política externa e a administração do território. Salta à vista como seria apropriado que o CEDN, em vez de se circunscrever artificialmente à Defesa Nacional, pudesse antes abarcar a Segurança Nacional como um todo. Com propriedade assim acontece nos outros Estados que optam por dispor deste tipo de instrumento (General Luís Valença Pinto, 2022).

Uma das linhas orientadoras que julgamos ser importante é o quadro de tendências globais, que obviamente evoluirá muito rapidamente na próxima década em termos de evolução tecnológica, alterações climáticas e a evolução demográfica.

A valorização do conhecimento e das várias línguas nacionais, assim como a valorização das comunidades angolanas espalhadas pelo mundo poderá ser uma das modalidades de aumento da influência nacional.

Como não podia deixar de ser, a área de informações revela-se estruturante para o planeamento da condução e decisão política. Permitem prever cenários e tornar a decisão política menos susceptível ao erro perante os objetivos permanentes e conjunturais.

Desta forma julga-se ser fundamental dar outra amplitude ao conceito existente, visto que o presente se encontra limitado.

Sendo um Conceito Estratégico de Defesa, por mais amplo que seja, não representa todas as ambições nacionais. 

Olhando para a definição de Segurança Nacional, o horizonte expande-se. Sendo que a Segurança Nacional é a condição da Nação que se traduz pela premente garantia da sua sobrevivência em paz e liberdade, assegurando a soberania, independência e unidade, integridade do território, a salvaguarda coletiva de pessoas e bens e dos valores espirituais, o desenvolvimento normal das funções do Estado, a liberdade da ação política dos órgãos de soberania e o pleno funcionamento das instituições democráticas (instituto de Defesa Nacional, 1979). 

Assumir a Segurança Nacional do Estado é também atribuir a responsabilidade da mesma à sociedade e aos cidadãos. Todos somos responsáveis pela unidade nacional.

Todavia, o país e as estruturas da sociedade carecem de um grande documento orientador, definindo o que deve ser feito e de que forma o fazer para superar as aspirações nacionais.

O Estado deve ser mais do que o somatório dos interesses individuais. Como cidadãos estamos vinculados por laços identitários e anseios comuns, por um ideário partilhado que nos diferencia e identifica como nação com uma história plurissecular. Temos uma língua e cultura próprias e uma identidade nacional forte, pelo que importa termos uma ideia do destino coletivo que pretendemos traçar (Agostinho Costa, 2019).

A segurança no conjunto de todas as suas dimensões é vital para a percepção e adaptação ao contexto geopolítica, geoeconómico, geoestratégico assim como às ameaças e riscos globais.

A materialização de um desiderato que responda à grandeza dos desafios nacionais e globais, requer uma grande estratégia de segurança nacional onde todos os cidadãos se revejam. Torna-se desta forma, essencial a criação de mais do que um documento publicado em Decreto Presidencial. 

Os últimos anos testemunharam o surgimento de um espectro de documentos abrangentes relacionados a estratégia de segurança nacional que foram criados, em parte, para institucionalizar a existência de direção a nível nacional para uma variedade de questões de segurança nacional e fazer isso a um nível não classificado para o público (Alan G. Stolberg, 2012).

Concluímos assim que a criação de um manual denominado Conceito Estratégico de Segurança Nacional, servirá de forma mais adequada os estudantes, docentes, militares, decisores políticos, economistas, estrategistas e todos os integrantes da sociedade angolana.

A adopção de um CESN deverá surgir num contexto de competição, e da premente necessidade de avaliar de forma permanente as ameaças e os riscos, identificando também as oportunidades, em matéria de segurança, questões ambientais, de saúde, tecnológicas e econômicas. Destarte, tornar Angola um país mais próspero e preparado para enfrentar os desafios globais.

Continue Reading
Click to comment

Leave a Reply

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *