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Opinião

Presidente de Angola Bakongo: Solução ou Ameaça ao Status Quo?

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Angola é uma nação plural, forjada a partir da convivência histórica de diversas culturas, línguas e etnias. A construção do Estado angolano moderno tem-se feito sob o peso de tensões políticas, heranças coloniais, exclusões estruturais e centralização do poder. Apesar dos avanços registados em vários sectores, permanece um desafio por resolver: a representatividade étnica real no exercício do poder político máximo, a Presidência da República.

Desde a independência, em 1975, Angola teve presidentes oriundos das regiões do Bengo (Agostinho Neto), Luanda (José Eduardo dos Santos) e Benguela (João Lourenço) — zonas geográficas tradicionalmente associadas à etnia Mbundu. Esta realidade tem alimentado discursos de exclusão e de desequilíbrio na construção do poder nacional. Neste contexto, a ascensão de um líder da etnia Bakongo dentro do MPLA apresenta-se como uma oportunidade estratégica e simbólica de grande impacto político e eleitoral.

A Representatividade Étnica como Pilar de Coesão Nacional

Segundo o cientista político Benedict Anderson (1983), as nações são “comunidades imaginadas”, onde o sentimento de pertença é construído com base em símbolos de unidade e partilha. A representatividade política, neste contexto, é um dos principais mecanismos de consolidação do sentimento nacional. Quando determinados grupos étnicos permanecem sistematicamente excluídos do topo da liderança nacional, instala-se um sentimento de marginalização, que pode enfraquecer a coesão interna.

O académico angolano Carlos Pacheco (2012) reforça que “a elite dirigente angolana consolidou-se num núcleo geográfico e étnico específico, o que cria desequilíbrios na percepção pública do poder e da justiça social”. Ao longo das últimas décadas, o MPLA tem sido associado a esta estrutura centralizada de poder, mesmo tendo desenvolvido esforços de descentralização e inclusão social em outras áreas da governação.

A Juventude Bakongo: Um Capital Político em Ascensão

A actual juventude Bakongo caracteriza-se por ser altamente conectada às redes digitais, espiritualmente resiliente e com forte consciência étnico-cultural, mantendo laços profundos com as suas raízes históricas e tradicionais. É uma juventude cosmopolita, com forte presença na diáspora, particularmente em países como a RDC, o Congo-Brazzaville, França, Portugal e Bélgica — o que lhe confere uma dimensão transnacional e uma visão mais crítica e sofisticada da política.

De acordo com estudos de Inocência Mata (2015), “a juventude africana é hoje um dos maiores agentes de pressão sobre os sistemas políticos, exigindo reformas estruturais, inclusão e autenticidade”. Entre os jovens Bakongo, este espírito manifesta-se também através de movimentos religiosos pentecostais, de empreendedorismo informal e de activismo digital. Eles são defensores de um Estado mais ético, transparente, descentralizado e inclusivo.

Além disso, muitos jovens Bakongo possuem níveis médios e superiores de escolaridade, incluindo formações em áreas como Direito, Relações Internacionais, Economia, Tecnologia e Ciências Sociais. O seu engajamento político não é apenas étnico-identitário, mas também programático, com grande interesse em temas como direitos humanos, liberdade de expressão, reforma do sistema judicial e fortalecimento das autarquias locais.

Esta juventude representa, assim, um novo eleitorado exigente, crítico e politicamente consciente, que poderá influenciar significativamente os resultados eleitorais, sobretudo no norte do país, caso se veja representada no topo do poder.

A Identidade Bakongo e a Reconciliação com o Norte

A etnia Bakongo, historicamente ligada ao antigo Reino do Kongo, ocupa as províncias do Uíge, Zaire, Cabinda e parte do Cuanza Norte. Com raízes profundas na história africana pré-colonial e um forte sentimento de identidade cultural, os Bakongo representam cerca de 13% da população e mantêm uma presença significativa nos sectores religioso, comercial e migratório. Tal como refere Jean-Marc Ela (2002), “a história das populações africanas não se explica apenas pela dominação colonial, mas também pelas continuidades e rupturas das suas instituições tradicionais”.

Nos últimos anos, algumas zonas habitadas por Bakongo — como Cabinda — têm expressado frustrações com o governo central, reivindicando maior autonomia e visibilidade. Neste cenário, a eleição de um presidente Bakongo poderia funcionar como uma ponte de reconciliação nacional, simbolizando um novo pacto de inclusão e equilíbrio geopolítico.

Vantagens Comparativas e Competitivas para o MPLA

Num país onde a demografia tem implicações directas na estratégia eleitoral, o MPLA tem diante de si uma oportunidade rara de ampliar a sua base de apoio e contrariar os avanços da oposição em zonas tradicionalmente descontentes. A UNITA, por exemplo, tem a sua base eleitoral mais forte no Centro e Sul do país, com destaque para os Ovimbundu.

Denílson Adelino Cipriano Duro é Mestre em Governação e Gestão Pública, com Pós-graduação em Governança de TI. Licenciado em Informática Educativa e Graduado em Administração de Empresas, possui uma sólida trajectória académica e profissional voltada para a governação, gestão de projectos, tecnologias de informação, marketing político e inteligência competitiva urbana. Actua como consultor, formador e escritor, sendo fundador da DL - Consultoria, Projectos e Treinamentos. É autor de diversas obras sobre liderança, empreendedorismo e administração pública, com foco em estratégias inovadoras para o desenvolvimento local e digitalização de processos governamentais.

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