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Polícia no Cazenga recebe 30 mil kwanzas para castigar preso até a morte – denunciam familiares
Os familiares de Matsoni Pedro, de 37 anos, acusam a Polícia Nacional, mais precisamente, os comandantes do Posto Policial dos Kwanzas, localizado no bairro dos Ossos e da 13ª Esquadra de conivência na morte do seu parente detido por agressão física.
Da acusação de Óscar Manuel Nzau, cunhado da vítima, ressalta-se o facto de ter dito de viva voz que o comandante do Posto policial dos Kwanzas, onde o malogrado terá sido detido pela primeira vez, recebeu valores das mãos do queixoso para castigar o seu cunhado.
“O comandante do posto policial já tinha sido corrompido e segundo as informações que recebemos, é que, o comandante recebeu 30 mil kwanzas para castigar o nosso irmão até ao fim”, denunciou, Óscar Nzau, solicitando a intervenção do Ministro do Interior e outros órgãos afins para solucionar o caso.
Relativamente ao terá motivado a detenção do seu cunhado, Nzau explicou que tudo deu-se quando um indivíduo apenas identificado por ‘Patrício’ ou ‘Patrick’, “um informante da Polícia aqui no bairro”, disse que terá perdido a sua pasta de documentos no local onde o malogrado faz a venda de bebidas.
“Ele foi lá perguntar se um dia antes (domingo 12) não esqueceu a pasta de documentos lá. O meu cunhado disse-lhe que não”, explicou.
Ao que disse, o jovem insatisfeito com a resposta, começou a ofender o malogrado a tal ponto que outros clientes que ali se encontravam a consumir intervieram solicitando a ‘Patrício’ que fosse procurar a carteira noutro local, já que o vendedor disse que não encontrou.
“Mas ele estava tão renitente que acabou por brigar com um outro cliente que ali se encontrava. Da briga, ele acabou por cair, ferir-se na boca e começou a sangrar”, sublinhou o cunhado do malogrado garantindo que o seu familiar em momento algum agrediu o jovem e no momento em que tentavam apaziguar a briga entre ambos, ao vê-lo a sangrar, o cliente pôs-se em fuga.
“O jovem saiu dali e foi fazer uma participação ao posto policial dos Kwanzas, localizado no bairro dos Ossos, sendo que algumas horas depois Mantsoni Pedro, o malogrado viria a ser detido por alguns agentes que o foram buscar em casa onde tem o espaço de venda de bebidas.
O princípio do fim
Óscar Manuel Nzau disse que o seu cunhado saiu dali a andar sem problema algum de saúde e tão logo aperceberam-se da detenção do cunhado, buscaram, de imediato, uma solução entre o queixoso e as autoridades, já que Mantsoni Pedro era acusado de agressão física.
“Mas no posto policial ficamos a saber que o tal ‘Patrício’ disse que perdeu 100 mil e um telemóvel e, por este facto, o meu cunhado tinha que ressarcir os valores e também o telemóvel caso quisesse sair da cadeia”, denunciou para depois dizer que ainda assim, persuadiram o jovem a retirar a queixa e que se fizesse uma declaração para se pagar, “mas ele não aceitou”.
No dia seguinte, acrescentou, tudo fizeram para se chegar a um consenso com o queixoso, principalmente, pelo facto de, uma hora depois de ter sido detido, Mantsoni Pedro, já teria sido transferido para a 13ª Esquadra, onde conheceu os seus algozes e dias depois viria a espancado até a morte sem que nenhum agente desse se apercebesse disso.
“Não sei como é que um cidadão, detido, está a ser agredido e possivelmente a gritar por socorro nenhum agente intervém para o acudir?”, questionou Nzau, sublinhando que as celas não distam a um quilómetro do espaço onde os agentes circulam.
“Mas ainda assim, o tal ‘Patrício’ depois reduziu o valor dizendo que já não eram 100 mil, mas sim, 30 mil kwanzas e caso não se pagar o meu cunhado iria passar mal na cadeia e até mesmo morrer, se fosse possível”, acusou, dizendo que ‘Patrício’ fez esta acusação inúmeras vezes a sua frente. Alias, Óscar nzau, na qualidade de cunhado, era ele, na companhia de outros vizinhos e a mulher do malogrado, que estavam a par da situação e a intermediar para que o caso fosse resolvido de forma amigável. O que não chegou a acontecer.
A morte de Mantsoni
Sobre a morte do seu cunhado, sabe apenas que “depois de muitos bailes na 13ª Esquadra, já que primeiramente disseram-nos que ele já tinha sido transferido para o comando de Divisão, ficamos a saber que o meu cunhado foi agredido por três bandidos com os quais dividia a cela”, explicou.
Segundo disse, horas antes, os seus familiares tinham sido alertados que Mantsoni Pedro Estava gravemente ferido em virtude das agressões de que era alvo, diariamente, e caso a família não interviesse, algo pior poderia acontecer. “Nem a alimentação que levávamos ele tinha direito”, denunciou.
“E foi na tarde do mesmo dia que ficamos a saber que foi agredido e morto”, sustentou, reclamando que mesmo tendo deixado o seu terminal telefónico aquando da detenção do cunhado, a família não foi tida nem achada para ser informada sobre o sucedido, nem para reconhecer o cadáver do seu parente.
O estado do corpo
Para Óscar Nzau, a conivência da Polícia é tão grande que precisa de ser responsabilizada. E diz porquê: “não se compreende os motivos que levaram os agentes da Polícia a esconderem para a família que o nosso irmão estava morto”, realçou, para depois dizer que até os dados do malogrado foram trocados, inclusive as causas da morte.
“Encontramos o meu cunhado totalmente sem roupa e sem documento. No papel de identificação colado ao seu corpo, o nome era outro e as causas da morte dizia que ele tinha sofrido um acidente na via expressa de Cacuaco”, explicou garantindo que era tudo falso até o terminal telefónico escrito no referido papel não chama.
Por outro lado, Óscar Nzau disse que no corpo da vítima eram visíveis os graves sinais de agressão: “Estava com as mãos amarradas, a cara totalmente inchada, a sangrar nos ouvidos, nos olhos e na boca e um grande ferimento na nuca”, denunciou, visivelmente abatido com o sucedido.
Por este facto, acrescenta, a família preferiu fazer uma autopsia ao corpo do falecido e traduzindo para ‘miúdos’ o resultado diz que o malogrado foi vítima de uma agressão com objecto contundente.
“Queremos justiça”
Este foi, de resto, o pedido dos familiares de Mantsoni Pedro, que deixa ao cuidado da viúva, cinco filhos, dos quais, dois rapazes e três meninas, estando o caçula com apenas oito anos.
“Queremos que o Estado ajude-nos a fazer justiça. Porque não se admite como é que um cidadão, chefe de família morre assim numa esquadra, sem que as autoridades digam alguma coisa”, solicitou, realçando que ‘Patrício’ o queixoso, abandonou a casa onde residia, “o que para nós, pressupõe que teve a ver com a morte do nosso familiar. E o comandante da 13ª Esquadra facilitou a fuga dele”, denunciou.
Não é a primeira vez
As mortes nas esquadras policiais em Luanda e um pouco pelo país não são de hoje e pelo andar da carruagem, parece que a culpa teima em morrer solteira.
Na 8ª Esquadra, no Rangel, por exemplo, no ano passado, três cidadãos foram barbaramente torturados até à morte.
Os familiares de uma das vítimas, José Padrão Loureiro, 40 anos, denunciavam as condições em que encontraram o seu ente querido.
Segundo relatos da irmã, Eurídice Padrão Morais de Brito, médica, que terá assistido à autópsia disse que ficou chocada com a forma como o torturaram.
O resultado da autópsia dizia que o malogrado teria sido vítima de “trauma craneocefálico total e [trauma do] abdómen”, sublinhando-se que estes traumas resultaram de “agressão com objecto contundente”.
Em Malange, também já houve um caso dessa natureza. Diogo Mendonça, de 33 anos, teria sido espancado por volta das 12 horas de terça-feira, 23 de Dezembro de 2016, por agentes da Polícia Nacional afectos ao Comando Municipal de Cacuso, conhecendo a morte no Hospital Municipal daquela localidade às 14 horas.
De acordo com Carlos Xavier Luís Lucas, secretário executivo da Convergência Ampla de Salvação de Angola (CASA-CE), o seu representante na região um dia antes (22) brigou com a namorada identificada apenas por ‘Lucinda’, que também mantinha relações amorosas com um agente identificado por ‘Joãozinho’, motorista do referido comando municipal.
O responsável chegou a formalizar a “queixa-crime” contra os agentes da corporação envolvidos no assassinato com o processo registado sob o número 228/2014 acusado já pelo Ministério Público, mas até ao momento, nada mais se soube sobre o caso.
Polícia a par da situação
De acordo com o Inspector chefe Mateus de Lemos Rodrigues, que falava à Radio Luanda, a respeito, o caso é já do domínio da Polícia Nacional.
Relatando o que terá acontecido, disse que Matsoni Pedro teria sido impedido de ir à casa de banho durante a noite por um indivíduo, também detido por ofensas corporais, que o terá empurrado contra a parede, levando Matsoni Pedro a cair e bater com a cabeça.
“Gostaríamos de dar a nossa garantia à sociedade e à família de que o crime não ficará impune, tendo em conta que já foram tomadas diligências das provas materiais e também das provas testemunhais que foram possíveis colher no local”, explicou, garantindo posteriormente que já tinham identificado o suspeito.
Em função disso, a família já tem o número do processo, no caso, 2355/017-CZ, do qual tem, segundo o papel que lhes foi dado na Divisão de Polícia do Cazenga, três detidos, presumivelmente, os mesmos que o agrediram até a morte na 13ª Esquadra.