Opinião
O populismo e a estabilidade do sistema partidário angolano: um novo desafio?
A Previsibilidade do Sistema Partidário
Semelhante ao sistema partidário norte-americano e ao português antes das eleições legislativas de 2024, o sistema partidário angolano apresenta um alto nível de previsibilidade. O que isso significa? É necessário analisar a relação entre previsibilidade e populismo para compreender melhor essa dinâmica.
Nos Estados Unidos, as eleições são dominadas por dois protagonistas principais: os democratas (azuis) e os republicanos (vermelhos). No entanto, a corrida eleitoral americana conta com outros partidos e candidatos independentes, que enfrentam dificuldades para desafiar o domínio democrata-republicano devido à falta de recursos e mecanismos essenciais.
As eleições de 2024 nos EUA, que elegeram Donald Trump como o 47º Presidente, foram marcadas por números expressivos, mas não alteraram a previsibilidade do sistema eleitoral:
• Donald Trump e J. D. Vance (Republicano): 77.302.169 votos
• Kamala Harris e Tim Walz (Democrata): 75.015.834 votos
• Jill Stein e Butch Ware (Verde): 861.141 votos
• Robert F. Kennedy Jr. e Nicole Shanahan (Independente): 756.377 votos
Os republicanos venceram amplamente, impulsionados por discursos de Donal Trump considerados populistas, abordando temas como imigração, nacionalismo, patriotismo, conservadorismo e a guerra na Ucrânia.
O Caso Português: A Quebra da Previsibilidade
O sistema português apresentava um cenário semelhante antes das eleições legislativas de 2024. O Partido Socialista (PS) e o Partido Social Democrata (PSD) dominavam amplamente o cenário político, até que a ascensão do CHEGA, partido frequentemente associado ao populismo, nacionalismo, conservadorismo, patriotismo e anti-imigração, alterou o equilíbrio de forças.
A coligação Aliança Democrática (AD), formada por PSD, CDS-PP e PPM, venceu as eleições com uma vantagem de 0,2% sobre o PS, de Pedro Nuno Santos. Entretanto, o grande destaque foi o CHEGA, de André Ventura, que alcançou 18,07% dos votos (1.169.836 votos) e conquistou 50 assentos no parlamento, contra 78 do PSD +2 do CDS/PP da AD e 78 do PS. O PS manteve-se como o partido individual com mais deputados devido à sua representação directa, sem coligações.
Angola: Um Sistema Partidário de Alta Previsibilidade
Em Angola, o sistema eleitoral tem sido previsível desde as primeiras eleições presidenciais de 1992. Na ocasião, José Eduardo dos Santos obteve 1.953.335 votos (49,57%) e Jonas Malheiro Savimbi ficou em segundo lugar com 1.579.980 votos (40,07%). Já nas eleições legislativas, o MPLA venceu com 2.124.126 votos (53,7%), conquistando 129 assentos, enquanto a UNITA obteve 1.347.636 votos (34,1%) e garantiu 70 assentos.
Os resultados de 1992 abriram caminho para eleições previsíveis no período pós-guerra civil, com apenas uma ameaça tímida ao bipartidarismo MPLA-UNITA, protagonizada pela Convergência Ampla Para Salvação de Angola – CASA-CE de Abel Chivukuvuku em 2012. No entanto, as eleições de 2022 mostraram um avanço significativo da oposição. A UNITA, liderada por Adalberto Costa Júnior, criou a coligação Frente Patriótica Unida (FPU) com o Bloco Democrático (BD) e o PRA-JA Servir Angola, alcançando 43,95% dos votos e ameaçando a maioria absoluta do MPLA na Assembleia Nacional.
O Populismo Pode Redefinir o Cenário Político Angolano?
O bipartidarismo em Angola sobreviveu a diversas ameaças políticas, incluindo a influência da FNLA que é reconhecido como participante activo na luta pela independência. Entretanto, resistirá à nova onda de populismo que tem fragmentado democracias consolidadas e sistemas partidários antes considerados previsíveis, como o português?
Novos partidos políticos, como o PRA-JA Servir Angola, já se posicionam como potenciais forças governantes para 2027. O Partido Liberal, sendo liberal poderá trazer propostas inovadoras e também busca espaço no cenário político. As próximas eleições podem ser as mais concorridas desde 1992.
Diante desse cenário, a questão permanece: os angolanos continuarão a decidir entre MPLA e UNITA, ou um novo partido se consolidará como alternativa real de poder?