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Opinião

O mercado informal

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O evidente e exponencial crescimento da  economia  informal, é um verdadeiro  dilema e sobre tudo  um sério desafio para actual Governação do país, a quem caberá orientar que tal se torne numa alavanca para revitalização do tecido empresarial  e numa base para o desenvolvimento da economia e da sua competitividade.

Usualmente quando falamos em economia informal, frequentemente associamos quase que exclusivamente a venda ambulante de bens (ex. CD) e serviços (ex.lavadores de carros). Na realidade, sua amplitude é muito maior, envolvendo enfermeiros, professores (vulgo explicadores), pirataria, manicures, advogados, mecânicos, cantinas (micro/pequenas -superficies comerciais), pescadores de pequeno porte, motoristas, mecânicos, engraxadores, chamadores de passageiro para candogueiros, o motorista de candogueiro… a lista é bastante generosa envolvendo toda e qualquer actividade lucrativa à margem do controle ou registro legal.

Um relatório recente da Organização Internacional do Trabalho (OIT), divulgado em Nova Iorque, coloca Angola como um dos países em todo o mundo com mais população (94%)  a participar ( que vive directamente ou nela recorre para aquisição de bens e serviço) da economia informal, ou seja, apenas 6%  faz parte ou transacciona na   economia formal. Por aqui podemos perceber a amplitude do problema.

Estes números da OIT, indicam-nos que a economia informal é um  denominador comum aos Angolanos, pelo que as soluções não podem oscilar entre o comportamento de  extremos sazonais: Num determinado momento complacência  e no outro de pesada repressão, pois, esta abordagem ao longo das décadas e mesmo no âmbito do estudo comparado, é conhecido o seu fracasso.

É um dilemas pelas seguintes razões:

1-Tradicionalmente, as despesas públicas e as necessidades de investimento público, são custeadas pelas receitas públicas que são primeiramente provenientes  dos impostos e taxas. Logo, se (tal como ocorre com os países ocidentais) não pudéssemos contar com o petróleo e diamantes, estaríamos numa condição efectivamnete comprometedora.

2-Porque um país com o nível de exposição de informalidade que o nosso tem, é um país mais vulnerável pois, a economia informal é também o meio de sustento do crime organizado que pode ir desde terrorismo a contrafação de produtos alimentares ou medicamentosos, com todos os perigos que representa a vida humana.

3-A nível micro, os individuos implicados na economia informal, não possuem qualquer tipo de protecção formal, o que no  médio-longo termo, acentua a condição frágil sócio- economica das famílias.

Não obstante, precisamos aceitar  a realidade, que o mercado informal é efectivamente  a mais forte plataforma contributiva da renda familiar,  ou  mesmo o único mecanismo de sobrevivência de muitas familias  em Angola.

Agregados há onde por exemplo o chefe de família actua  no mercado formal, por exemplo como motorista em uma empresa, cuja família (agregado de 6 pessoas por exemplo) inicialmente que sobreviva apenas com a renda salarial do chefe de família, não raro mais 1 ou dois elementos daquela família irá praticar alguma actividade sem registo, e não necessariamente ambulante como é o caso da  mãe dedicar-se a costura –alfaiataria na residência e a filha/filho mais velho prestar serviço como explicador de apoio ao ensino de base ou de língua inglesa,  igualmente no domicilio.

Muitos dos actores da economia informal, não dependem do Estado, vivem à margem da participacao do processo de crescimento economico.

Por um lado, considero  a operação resgate como uma  medida  de contenção, com resultado quase fugaz, uma rotina que todos já conhecemos que vária entre    algum desleixo da presença da autoridade administrativa num determinado  momento e no outro, um cenário de de repressão. Num manifesto comportamento  de” 8 a 80”.

Por outro lado, concordo absolutamente  que é imperioso a redução progressiva da informalidade da nossa economia, mas a repressão policial por si só,  não é em definitivo uma solução sustentável do problema.

Precisamos ser sensatos  e compreender que na busca do auto sustento, não pode ser aceite o “vale-tudo”, de contrário, renunciamos o modelo de organização política que temos e retornamos ao Estado de natureza o que não é certamente desejável.

Entretanto, penso que se por um lado o Estado deve buscar aumentar as receitas tributária  e zelar pela ordem pública, por outro lado, deve priorizar que se  viabilize a aproximação das partes, criando condições que tornem o processo e os procedimentos o mais simplificados e acessíveis  possíveis.

A aborgagem dos grandes mercados (superfícies)  para concentração dos vendedores, faliu desde a queda do Roque Santeiro, esta ultrapassada, não é mais um o modelo que encontre acolhimento.  Eventualmente devemos refletir em torno da implementação de feiras comunais (pequenos mercados/feiras de proximidades), em que o feirante aprenda a observar normas, e a exigir o seu direito num franco exercícío de cidadania.

Por exemplo, o micro empreendedor não pode ser cobertos em termos procedimentos da burocracia do Estado, do mesmo modo que o médio empreendedor.

Temos uma população com um nível de literacia baixo, pelo que muitos sequer percebem claramente  a importância e os beneficios  de procederem os respectivos registos legais, outros, sequer documentos pessoais possuem.

Estou lembrada que nas últimas eleições, o Conselho Nacional Eleitoral fez um bom trabalho  ao lançar com êxito uma campanha de esclarecimento aos eleitores sobre os passos para votar e como cada cidadão podería tomar conhecimento sobre o local e mesa de voto. Foi um bom exercício e experiência obtida, que juntamente com a experiência do censo populacional, o Ministério do Comercio poderia engajar uma campanha que com o propósito de   esclarecer, admoestar  e cadastrar os diferentes actores do mercado informal em todo territorio Angolano.

Muitas vezes, o que as pessoas necessitam é de orientação.

Depois dos resultados das últimas eleições, uma das minhas maiores  expectativas, foi efectivamente a organização do Governo.  Tendo em conta que um novo Presidente  estava a assumir o Estado com sérios problemas economico-financeiro, alta taxa de desemprego, de criminalidade, crescimento da economia informal, dei  como certo, a criação pela primeira vez em Angola do Ministério do Empreendodorismo e Inovação, facto que não ocorreu o que deixou-me algo preocupada…

Se  o desenvolvimento económico é o grande desafio desta Governação, então, a forma como organiza-se o Governo deve efectivamente evidenciar isto…

Hoje em quase todo mundo,  o processo de internacionalização é muitas vezes engrossado por pequenas e médias empresas, pelo que, com um programa bem orientado, muitos artesãos por exemplo, que hoje actuam na informalidade,  poderíam incrementar a exportação de produtos traços  caractéristicos da nossa cultura e não só.

Nossas frutas consideradas exóticas e muito apreciadas e  hoje muito usadas por empreendedores angolanos  para transformar em compota, pode constituir um excelente produto de exportação para o país.

Muitos destes pequenos produtores têm produtos de excelente qualidade, entretanto, quase todos são de produção irregular e sequer satisfazem o mercado doméstico. Quando questionados, a responta é quase sempre a mesma: falta de capacidade financeira para satisfazer a demanda.

Ora, se por um lado o banco tem um papel a cumprir na economia, por outro, ele é um actor privado  e o seu móbil é o lucro. Os bancos, como qualquer outro actor economico,  quase sempre procura distanciar-se do risco, o que é legitimo.

Dados de 2017 indicam que a taxa de mortalidade das empresas em Angola rondam aos 70% ou seja, em Angola, ao fim de um ano de actividade, apenas 30 em cada 100 empresas criadas sobrevivem.

Logo, o risco associado ao crédito a estas empresas, constituem um sério e real problema.

Por exempo, aposto muito na redução da economia informal, com o fortalecimento da economia social. Para o efeito, precisamos por exemplo, de  dinamizar, planificar e  orientar pequenas cooperativas.

Juntos somos sempre mais fortes,  mitigamos os custos e riscos. Este é um dos  princípios da economia social que entre nós mesmo em crise, quase não abordados. O Brasil exporta temperos caseiros tradicional (sal e alho) por exemplo, produtos de fácil confecção e de baixo custo.

Penso que, uma cooperativa devidamente planificada e orientada, oferece menor risco, para a entidade financiadora, permite melhor gestão operacional ao mesmo tempo que permite maior  eficiencia na implementação de programas de formação, e consequentemente melhor implementação de  inovação quer no produto/serviço quer no processo.

Medidas bem planificadas e orientadas no âmbito de cooperativas, resultam em negocios mais sólidos, geram maior  troca de experiencia,   de know-how e investimentos mais seguros, o que resulta em mais empregos e maior e mais sustentável  arrecadação de receitas para o Estado.

Um programa de dinamização do micro e pequeno empreendedor, pode ajudar a reduzir a actividade informal, não só procedendo a cadastro, mas, orientar formação e auxilio financeiro. Este tipo de programas, dificilmente são financiados pela banca conventional, deve ser primeiramente um engajamento do Estado, criando fundos com uma gestão  sustentáveis para estes programas.

Por exemplo, defendo que o repatriamento de capitais quer o voluntário quer o coersivo, devia gerar uma percentagem (por exemplo 20%) para um fundo de apoio ao micro emprendedor.

Por outro lado, também é necessário compreender que apesar da credibilidade dos estudos sobre o alto índice de empreendorismo em Angola, o facto é que muitos que o exercem não tem vocacão, e quando têm, falta preparo/formação e depois,  a capacidade financeira para realização do investimento. E isto explica a alta taxa de mortalidade das empresas em Angola.

Muitos dos supostos empreendedores  o fazem por falta de alternativa imediata de sobrevivência, muitas vezes mantidos /suportados por actores  da economia formal, pelo que, não podemos negligenciar  as medidas estrututantes, macro-economicas   no âmbito da redução das  desiqualdades e assimetrias regionais  para que as familias possam encontrar na sua região condições básica para a sua realização.

 

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