Crónica
O Maior Problema de Angola Não É Económico, É Mental
Em Angola, aprender a estar desperto por dentro não é luxo espiritual, é questão de sobrevivência psicológica. Especialmente em Dezembro de 2025, quando o pensamento pesa mais do que saco de arroz em época de escassez e a mente acorda cansada antes mesmo do corpo sair da cama.
O angolano pensa muito. Pensa no salário que não esticou até ao dia 25, pensa no preço do combustível que sobe como fé em culto de domingo, pensa na promessa do dirigente que ainda está “em estudo”, pensa no parente que liga só em Dezembro com voz doce e pedido urgente. Pensar, aqui, não é opção. É rotina nacional.
Mas o problema nunca foi o pensamento. O problema é quando nos confundimos com ele. Quando achamos que aquele pensamento pessimista é a nossa identidade, quando acreditamos que a narrativa interna é decreto presidencial. Aí nasce a tempestade. Porque pensamento em Angola, quando não é observado, vira conversa de esquina, boato de táxi azul e branco, análise política sem dados e esperança com prazo vencido.
A negatividade, por cá, encontra passagem fácil. Basta um instante de distração no presente e pronto: a mente foge para o futuro incerto ou regressa ao passado mal resolvido. É nesse momento que o agora é abandonado como projecto público mal fiscalizado. A consciência fragmenta-se entre medo, expectativa e aquela velha pergunta: “Mas afinal, quando é que isto melhora?”
Estar presente, em Angola, tornou-se um acto revolucionário. É quase subversivo. Quem está presente demais começa a perceber coisas. Começa a não se deixar levar por discursos vazios, por estatísticas optimistas sem reflexo no prato, por promessas recicladas como pneus usados. A presença protege. A ausência entrega.
Cuidar da qualidade dos pensamentos, então, é acto de amor-próprio e também de cidadania mental. Porque pensamento negativo não combatido vira resignação. E resignação, por aqui, já temos em excesso. Medo, escassez e dúvida não precisam de pancada, só de lucidez. Basta reconhecê-los e dizer: “Eu vi-te. Mas não mandas em mim.”
E é aqui que entra o ritual moderno angolano de 2025: quando o pensamento negativo tentar instalar-se como dirigente vitalício da sua mente, diga com calma e ironia interior: “Cancelado. Cancelado. Cancelado.” Não aos gritos, não com raiva. Diga como quem encerra um contrato mal negociado. Depois, redireccione a mente. Pode ser para a gratidão de ainda estar de pé, para a fé que não depende de discursos, ou para aquela capacidade quase mágica do angolano de rir no meio do caos.
A repetição desse gesto cria hábito. E hábito cria cultura. Com o tempo, a mente aprende que nem todo pensamento merece cargo, nem toda ideia merece mandato. Algumas devem ser apenas observadas e gentilmente despedidas.
Dominar os pensamentos não é vencê-los à força. Isso seria muito pouco angolano. É escolher onde permanecer. Aquilo que você observa perde poder. Aquilo que você alimenta cria raízes profundas, como problemas estruturais mal resolvidos.
No fim deste 2025 cansado, a grande pergunta não é o que passa pela sua mente, porque em Angola passa de tudo. A pergunta é: quem você ainda permite que fique aí dentro, sem prestação de contas?