Opinião
O impacto da guerra na Ucrânia no continente africano
Questão alimentar é um assunto de Segurança Nacional, ou seja, é Soberania Nacional.
Muitos países no mundo dependem da Rússia e da Ucrânia em larga escala, no quesito importações de produtos ligados à agricultura, como cereais, grãos, trigo, fertilizantes e óleos vegetais, e isto não é simplesmente os países subdesenvolvidos, mesmo os países do G20 e boa parte dos BRICS, também importam, porém, é o continente africano, o que mais importa bens e serviços, que o seu impacto ganhou uma dimensão desafiante para a produção interna de cada Estado. Importa ainda realçar que a guerra afectou os mercados globais de commodities, elevando o preço de alimentos na África, pela fraca substituição e produção interna.
A Rússia e a Ucrânia são grandes exportadores e controlam este mercado há anos. Os dois países são conhecidos como o “celeiro da Europa”, representam 29% das exportações globais de trigo e 19% das de milho, segundo dados do banco JP Morgan. E com esta guerra, a volatilidade do mercado é notória, elevando para até produtos como petróleo e gás, onde deixou aqui uma certa abertura para os países africanos, peculiarmente o gás.
Mas vamos ao ponto.
O continente africano há muito tem se esquecido de olhar para a auto-suficiência agrícola, pois, não tem sentido estas questões de falta de determinadas commodities, mesmo tendo tudo para controlar este mercado, mas as decisões políticas, bem como as oligarquias e monopólios instalados, se beneficiam muito com este modelo, o que faz com que pouco ou nada fazem para inverter modus operandis, logo, quando o vendedor tem alguma dificuldade em honrar os compromissos, há escassez e, concomitantemente, uma subida acentuada destes produtos, o que faz com que o impacto seja avassalador, sobretudo numa fase de recuperação da COVID-19. Os países desenvolvidos sentiram, imaginemos os países subdesenvolvidos? É preciso inverter o quadro, olhar para esta dificuldade e encontrar as melhores oportunidades.
Um dos grandes aspectos que deve ser referenciado é no âmbito político, neste momento, o conflito teve de definir os países alinhados e os não alinhados, os que apoiam a Rússia e os que apoiam a causa ocidental. Na verdade, os votos nas Nações Unidas é um ponto de partida para perceber de forma categórica quem está com quem, e, como os africanos votaram, definirá os apoios e as alianças em varias matérias, na dimensão e preponderância, o que pode impactar positiva e negativamente em função do seu posicionamento.
O impacto para África não se assentou no tocante energético, teve sim alguma influência no preço do petróleo e gás a nível global, mas se África tivesse um mercado organizado no sector energético, tiraria maior partido disto, infelizmente, não se organizou, e somou muitas perdas no sector alimentar, porque boa parte dos fertilizantes necessários para a diversificação económica, fazem parte destes produtos encravados nos portos.
Os preços do trigo em algumas bolsas foram negociados nos maiores valores em 14 anos, e, muitos países africanos, tiveram que procurar outros fornecedores temporários, para sanar a problemática. Para termos uma ideia mais robusta, a Ucrânia é o maior produtor mundial de azeite de girassol, e a Rússia ocupa o segundo lugar, segundo a S&P Global Platts. Juntos, representam 60% da produção mundial, e em África, estes produtos, para além de estarem em escassez, o pouco que há no mercado atinge um preço acima dos 50%, o que empobrece mais as famílias que carecem destes produtos, logo, se e a colheita ou o processamento são prejudicados, se as exportações são interrompidas de alguma forma, os países importadores precisam encontrar formas de substituir esse fornecimento, e aí reside o subida dos preços. O impacto da guerra na produção de grãos chegou a duplicar os preços internacionais do trigo, o que afectou gravemente vários países que dependem das importações destes grãos, e para o nosso conhecimento, por sermos dependentes, África sofre a dobrar.
O director do Programa Mundial de Alimentos, David Beasley, disse à BBC que o aumento de preços devido ao conflito na Ucrânia pode ter um impacto catastrófico sobre as nações mais pobres.
Por esta razão, o Secretário Geral das Nações Unidas, António Guterres, teve de fazer de tudo para que, pelo menos a parte alimentar fosse salvaguardada, para não afectar mais os países mais pobres, onde a Turquia, com Taiyp Erdogan, ficou a cargo de ser o crivo deste processo, com uma equipa pujante para fiscalizar o escoamento destes produtos e minimizar os problemas, evitando que o impacto fosse muito mais devastador.