Opinião
O enigma das Leis: como a burocracia e o IVA estão a sufocar os negócios em Angola
A dinâmica legislativa angolana, especialmente no que se refere às normas que regulam os negócios, revela um cenário inquietante de descompasso entre as realidades do empresariado e as decisões tomadas no parlamento. A aprovação de leis por deputados que, em grande parte, carecem de experiência prática no ambiente dos negócios em Angola coloca em causa a eficácia das medidas implementadas. Afinal, de um total de 220 deputados, quantos possuem uma compreensão real dos desafios e oportunidades inerentes à atividade empresarial no país? Esta questão torna-se ainda mais crítica quando se analisa o peso dos custos de conformidade e a rigidez de certos dispositivos fiscais.
Entre as várias medidas que têm suscitado polémica, destaca-se a imposição de um IVA de 14% pela AGT, que se revela particularmente oneroso num mercado onde o poder de compra dos angolanos já não é o que era. Tal cenário contrasta de forma gritante com o facto de que alguns operadores, enquadrados no regime simplificado, beneficiem de taxas reduzidas, algumas vezes a 7% ou mesmo se isentem do pagamento do referido imposto. Este dualismo cria um ambiente desigual, onde a concorrência se dá entre empresas sujeitas a diferentes encargos, minando a confiança no sistema e desincentivando o investimento.
A imposição de limites à auto faturação, fixada em 20 milhões de kwanzas, impõe outra barreira à modernização do sector. Num mundo cada vez mais digitalizado e globalizado, tais restrições parecem anacrónicas e contrárias à evolução natural dos processos comerciais. Em simultâneo, o excesso de burocracias obriga os empresários a enfrentar um labirinto administrativo que não só aumenta os custos operacionais como também desmotiva a formalização e o investimento. O consumidor, por sua vez, é frequentemente colocado no centro desta tempestade: pagar impostos torna-se um fardo sem contrapartida aparente, pois dificilmente se visualiza na prática o retorno direto dessa contribuição para a melhoria dos serviços ou infraestruturas.
Importa ainda sublinhar que a crítica à política fiscal não significa, de forma alguma, que o contribuinte esteja a personalizar um problema com a AGT. Muito pelo contrário, o que se pretende é que o cidadão continue a contribuir para o desenvolvimento do país, mas sem ser penalizado por um sistema que parece ineficiente e descoordenado. A sensação de que “se paga para nada” emerge com força, alimentada pela falta de transparência na aplicação dos recursos recolhidos e pela aparente equiparação dos informais por exemplo, aqueles que organizam festas aos verdadeiros empresários. Este enquadramento homogéneo de realidades tão diversas contribui para um clima de insegurança jurídica e prejudica a competitividade.
Numa perspectiva de soluções, urge uma revisão profunda do actual sistema legislativo e fiscal. A implementação de algoritmos impactantes isto é, sistemas digitais de gestão e controlo fiscal que permitam uma melhor monitorização dos processos e uma simplificação dos trâmites burocráticos surge como uma das alternativas mais viáveis.
Estes sistemas poderiam:
* Integrar plataformas de auto faturação que ultrapassem os atuais limites, adaptando-se às necessidades das empresas em crescimento;
* Automatizar a verificação dos encargos fiscais, garantindo uma aplicação equitativa das taxas, de forma a reduzir discrepâncias entre o regime normal e o simplificado;
* Promover uma análise mais detalhada do perfil dos contribuintes, diferenciando entre pequenos informais e empresários de larga escala, de forma a calibrar a tributação de forma justa e proporcional.
Adicionalmente, é imperativo que os responsáveis políticos estabeleçam um diálogo contínuo com a comunidade empresarial, valorizando a experiência prática e o conhecimento do mercado. A criação de comissões consultivas, integradas por especialistas e empresários com experiência consolidada, pode ser um passo decisivo para alinhar as políticas públicas às reais necessidades do sector. Esta aproximação permitiria não só a elaboração de leis mais sensatas e adaptadas à realidade angolana, como também a construção de uma relação de confiança entre o Estado e os empresários, onde o pagamento de impostos se veja como um investimento no futuro comum.
Em suma, a reflexão sobre a legislação aprovada para o ambiente de negócios em Angola impõe a necessidade de um repensar estrutural do sistema. Enquanto os legisladores persistirem em adotar medidas sem a devida compreensão do terreno onde se aplicam, os efeitos colaterais desde o aumento dos custos de conformidade à perda de competitividade continuarão a impactar negativamente a economia. O desafio, portanto, reside em construir um modelo de governança fiscal que seja, simultaneamente, moderno, justo e eficiente, onde o contribuinte não se sinta punido pela própria contribuição, mas sim parte integrante de um processo de desenvolvimento sustentável e transparente.