Opinião
A nossa cultura, as mortes, o presente e o futuro
Por: Victor Hugo Mendes
Fazemos parte do mesmo mosaico cultural e a pesar de Angola ser um país vasto, tradicionalmente forte, nunca antes se sentiu o universo musical tão longe de quase tudo principalmente quando ela mais precisa das outras artes.
Em menos de 10 dias, a música angolana perdeu dois grandes astros. O mestre Kamosso aos 90 anos e o jovem Wiza aos 40…
Mestre Kamosso nasceu em 1927, Icolo e Bengo, angolano que se tornou famoso pela forma como tocava o hungu. Um instrumento musical tradicional. Ele conseguiu obter toda a escala harmónica do utensílio.
Pena é que os artistas sejam muitas vezes reconhecidos no leito da morte ou mesmo já depois de partirem para a eternidade.
Não sei se para ele o mais importante. De qualquer forma fica claro que ha pobreza de se dar a conhecer as nossas referencias e das artes, pior ainda. A cultura é mais do que a politica e tem mais valor do que a economia.
O malogrado pelo seu bem cantar, prenhe de sátiras, matriz cultural do quotidiano das populações da região de Icolo e Bengo e desta forma foi celebrizado como o carismático “Mestre Kamosso” e o tocador de hungu. Le-se numa nota de imprensa do ministério da cultura que salienta que o mesmo foi um símbolo da cultura nacional, que bem soube representar o país no estrangeiro.
Mestre Kamosso. Um símbolo nacional que morreu pobre, desgraçado e sem assistência durante muito tempo. Como foi possível ter faltado tanto amor, tanta solidariedade e tanta compaixão, a uma pessoa que foi considerada como símbolo nacional. A pergunta que aperta a minha garganta e desmotiva quem vê na arte o símbolo mais bonito para se viver.
O desaparecimento físico do mestre Kamosso, deixa um vazio no xadrez da cultura nacional pois, apesar do seu legado ter sido herdado por grupos de jovens, ainda lhes faltará, certamente, a mestria sábia de um excelente executante.
Excelente homem que foi esquecido, desvalorizado e que não deixou mais nada senão a lembrança do seu feito enquanto músico.
O Icolo e Bengo, terra de Manguxi e de Uanhenga Xito, viu agora partir Miguel Adão Filho, Mestre Kamosso, que faleceu na noite de sábado, aos 90 anos de idade, vítima de doença.
A sua arte influenciou diferentes gerações, contribuindo para o surgimento de grupos folclóricos como Jovens do Hungu, Idimakaji, Semba Muxima e Ilundus.
Partiu, partiu um homem que deixou uma marca. Foi-se o mestre camosso, sem deixar um livro escrito nem uma rua com seu nome. De Fidel recebeu umas botas e este até uma via com dezenas de kilometros tem com seu nome. Foi o símbolo, um rei sem coroa.
Mas a cultura Angolana, chora também a morte de João Sildes Bunga “Wiza” também vítima de doença.
A notícia foi avançada por uma fonte familiar, tendo a mesma referido que o artista teve um “mau estar” súbito e foi levado ao hospital onde acabou por falecer.
O cantor “Wiza”, de 37 anos de idade, nasceu na província do Uíge e veio com sua mãe à Luanda, em 1984, devido a guerra. Wiza trouxe consigo as recordações da vida no campo, amor, música, costumes religiosos e a saudade da terra que ficou longe. De sua mãe, que fabricava e tocava kissange, Wiza herdou o gosto e aperfeiçoou a técnica desse instrumento musical angolano.
Na língua nacional Kikongo, deixava de rastos qualquer ouvido mais culturalmente treinado. Puro, autentico e ousado, Wiza sabia dar voz a cultura, a tradição e empreendia ritmo a nossa historia.
Wiza conquistou espaço nas rádios de Luanda, com o tema “Mpasi” que significa sofrimento. Entre os seus discos mais conhecidos destacam-se “África Yaya” e “Kinsona”.
Jovem artista, trabalhou duro para vencer na vida. Foi varredor e sozinho nas ruas aprendeu a tocar violão que ganhou de um bondoso homem que o ouviu a cantar.
O talento natural, sem se frustrar, foi nos becos da kianda que se forjou e mudou as cordas que deram vida a uma voz respeitada. Até o Paulo Flores reconheceu o grande talento de Wiza e o convidou para abrir um dos seus shows.
Fez o que mais gostava. Gravou o que sempre sonhou mas morreu de repente. Jovem calmo, educado que também discutia mais respeito pelos artistas.
Não é so vaidade, nem palavras bonitas. Hoje choramos e procuramos por outras referencias com um Wiza e até as sombras nos mostram Wiza, Wiza, Wiza.
Agora restam-nos as lembranças, fica a dor e sonho de que um dia, os artistas serão bem reconhecidos, respeitados e valorizados com dignidade.