Politica
No apoio ao líder: MPLA assemelhasse mais aos Democratas dos EUA do que a UNITA
O presente texto nada tem a ver com perspectivas e práticas democráticas. É um olhar sobre como os diferentes líderes partidários organizam-se para obter os melhores resultados eleitores para alternância ou para a manutenção do poder. Desde a abertura democrática em Angola, há 32 anos, só em 2022 os ‘camaradas’ apresentaram-se sem grande parte de seus ‘gurus’.
A Convenção do partido Democrata dos Estados Unidos da América está a servir de lição para os partidos de todo mundo, não só na perspectiva democrática, como também organizacional e na forma de cerrar fileira à volta dos escolhidos pela maioria dos militantes.
Os elogios carregados nos discursos proferidos na Convenção envernizam a imagem de espécie de ‘ovelha negra’ como a que Joe Biden estava a ser pintado não faz 30 dias, dada a sua inicial intransigência em procurar uma reeleição contra um Donald Trump, que vinha a todo vapor.
É sabido o jogo intramuros realizado pelo antigo presidente democrata Barack Obama, visando afastar o seu ex-vice-presidente da corrida eleitoral de Novembro. Nalguns círculos, tem-se a percepção de que de alguma forma Joe Biden foi empurrado a aceitar a realidade a bem dos Democratas, e da América, como apregoam.
Ao ter aceite o apelo de seus camaradas, Joe Biden sai como herói por devolver a esperança aos Democratas de que a vitória ainda é possível, e como um patriota, pelo facto de, na análise do seu partido, estar em jogo a democracia, sendo que a vitória de Donal Trump é tida como um perigo para o Estado Direito e Democrático na América.
De forma espectacular, os Democratas cerraram fileiras à volta da imagem de Joe Biden, e Kamala Harris, a sua escolhida para o substituir.
Como se nunca estiveram contra Biden, os elogios vieram de todos os lados, da família Clinton, Obama e de Nancy Pelosi, antiga presidente da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos da América, entre 2019 e 2023.
Em Angola, o MPLA só atingiu tal nível com o antigo Presidente José Eduardo dos Santos (já falecido), e um pouco ainda com João Lourenço, em 2017.
“O que eu admirei mais em Joe não foi apenas a sua experiência, foi sua empatia e decência. E sua resiliência. (…) A história vai lembrar de Joe Biden como um presidente excepcional, que defendeu a democracia em um momento de grande perigo. Estou orgulhoso de chamá-lo de ‘meu presidente’, mas ainda mais orgulhoso de chamá-lo de ‘amigo’”, disse o antigo presidente norte-americano Barack Obama, que há poucos dias, longe dos holofotes, manifestava certa irritação com Biden, por este resistir à pressão para ceder o lugar da campanha Democrata contra o candidato Republicano.
“Temos a chance de eleger alguém que passou a vida inteira tentando dar às pessoas as mesmas chances que a América lhe deu”, sublinhou ainda Barack Obama, referindo-se a Kamala Harris, a candidata escolhida por Joe Biden.
As antigas primeiras-damas, Hillary Clinton e Michelle Obama, teceram igualmente palavras de carinho e apreço ao trio Joe, Kamala e Tim Walz, este que concorre para o cargo de vice-presidente pelos Democratas.
Bill Cliton, que serviu como o 42.º presidente norte-americano entre 1993 e 2001 considerou que a decisão de Joe Biden de abandonar a corrida à Casa Branca vai enaltecer o seu legado, à semelhança de George Washington, o primeiro presidente da América independente (de 1789 a 1797), que optou por ocupar o cargo por apenas dois mandatos de quatro/quatro anos, numa altura em que não havia sequer essa obrigação constitucional.
Clinton destacou também a coragem, o serviço e o sacrifício que Joe Biden empreendeu para América vencer.
O caso angolano…
Desde a morte de Jonas Savimbi, a UNITA, maior partido na oposição, tem tido dificuldades de cerrar fileiras à volta de seu líder e/ou de seu candidato. Isaías Samakuva beneficiou um pouco do facto de muitos dos altos quadros do partido terem estado a sair das matas e do exterior, e que em face disso, precisavam de juntar os retalhos de então, mas passado essa espécie de ‘período de carência’ (numa linguagem financeira), o ‘galo negro’ conheceu imensos dissabores internos, com acusações mútuas publicamente, entre os ‘gurus’ da organização.
Se Isaías Samakuva experimentou um bocado da falta de consenso e sentido partidário, durante o seu consulado de 13 anos, o seu substituto, Adalberto Costa Júnior, tem enfrentado afrontas e falta de apoio cerrado bem a ‘céu aberto’.
Embora Adalberto Costa Júnior tenha sido eleito pela maioria dos militantes, no congresso de 2019, quadros do próprio partido recorreram ao Tribunal Constitucional para chumbar o referido conclave, e assim foi.
Apesar de eleito novamente no congresso repetido em 2021, Adalberto ainda continua a enfrentar críticas e acusações graves contra a sua pessoa e liderança política nas redes sociais por parte de seus militantes, do topo à base.
O próprio Isaías Samakuva, seu antecessor, em momento algum fala publicamente de algum feito digno de realce protagonizado por Adalberto Costa Júnior. Pelo contrário, levanta questões que o colocam do lado oposto a Adalberto, sobretudo em relação a assunto ligado à Fundação Jonas Savimbi ou em relação a aparente divergência que Adalberto Costa Júnior trava com o Presidente da República João Lourenço.
Já ao nível do MPLA, em uníssono, nos 32 anos de democracia, os camaradas sempre cerraram fileiras à volta de seu presidente.
Naquilo que é o discurso então trazido para fora, José Eduardo dos Santos era o mais capacitado para não só liderar o partido mas também o País.
Epítetos em relação a José Eduardo dos Santos como o “arquitecto da paz” e “líder visionário” e/ou ainda o “escolhido por Deus”, soaram por toda Angola.
E o Presidente João Lourenço, a sua opção para o substituir, também beneficiou dessa tradição do MPLA de cerrar fileiras e endossar uma imagem mais acertada do líder, sem máculas.
A prática, entretanto, tem vindo a perder força nos últimos tempos, em grande medida, de acordo com alguns observadores, por conta dos resultados do combate à corrupção, bem como a actual conjuntura económica do País, desde a inflação, o desemprego, e a redução significativa da classe média, que aparentemente era maioritariamente constituída por seus militantes.