Opinião
“News influencers”: o fim do Jornalismo ou a Nova Era da Desinformação?
Inicialmente é importante trazer o conceito de influencer, que surge no contexto das redes sociais e da economia digital, designando indivíduos que, através da sua presença online, conseguem exercer influência sobre o comportamento e opiniões de um público específico. Os influenciadores digitais, inicialmente focados em áreas como moda, tecnologia e entretenimento, expandiram-se para o campo da informação, dando origem aos chamados news influencers.
O fenómeno dos influenciadores ganhou força com a massificação das plataformas digitais na década de 2010, especialmente com o crescimento de redes como Facebook, Instagram, Twitter (hoje X), YouTube e TikTok. A facilidade de acesso à informação e a crise de credibilidade dos meios tradicionais criaram um ambiente propício para que indivíduos sem formação jornalística começassem a reportar e comentar eventos globais, tornando-se fontes primárias de informação para milhões de seguidores.
Este fenómeno tem transformado profundamente a forma como as notícias são produzidas e consumidas, particularmente entre as gerações mais jovens. A ascensão dos news influencers representa uma revolução ou um risco para a informação de qualidade? Como garantir que a disseminação de notícias neste novo formato mantenha padrões éticos e de veracidade? Para responder a estas questões, é essencial analisar o impacto dos news influencers no ecossistema informativo e na forma como os jovens interagem com a realidade.
O Declínio do Jornalismo Tradicional e a Ascensão dos News Influencers
Historicamente, os grandes meios de comunicação — jornais, rádios e televisões — exerciam um papel central na mediação da informação. O jornalista profissional, enquanto agente da notícia, passava por um rigoroso processo de verificação dos factos antes da publicação. Contudo, com a digitalização, essa hegemonia começou a ser desafiada.
Segundo Manuel Castells (2009), na sua obra A Sociedade em Rede, “o surgimento da Internet e das redes sociais descentralizou a produção e o consumo de informações, dando voz a indivíduos que antes dependiam dos grandes conglomerados mediáticos”. Este novo paradigma criou um ambiente no qual qualquer pessoa com acesso à Internet pode tornar-se um produtor de conteúdos informativos, atingindo milhões de espectadores sem a necessidade de intermediários tradicionais.
Os news influencers aproveitam essa dinâmica ao construir as suas audiências com base numa relação de proximidade e confiança, algo que os meios convencionais têm dificuldade em replicar. Plataformas como YouTube, TikTok, Instagram e X (antigo Twitter) transformaram-se em veículos primários de informação, onde influenciadores partilham análises, reportagens e opiniões de forma directa e muitas vezes simplificada.
O Papel dos News Influencers na Geração Z
Os jovens da Geração Z (nascidos entre 1995 e 2010) são nativos digitais, acostumados a consumir conteúdos em redes sociais desde cedo. Diferentemente das gerações anteriores, eles não dependem da televisão ou dos jornais impressos para se informarem, preferindo conteúdos rápidos, interactivos e personalizados.
De acordo com um estudo do Reuters Institute Digital News Report (2023), a maioria dos jovens entre 18 e 24 anos recebe notícias por meio de influenciadores digitais e redes sociais, em detrimento de fontes jornalísticas tradicionais. Este dado reforça a ideia de que a linguagem acessível, o dinamismo e a interactividade dos news influencers são factores determinantes para a sua popularidade.
Pierre Lévy (1999), em Cibercultura, destaca que “a Internet permite uma inteligência colectiva, na qual indivíduos contribuem para a construção da informação de forma descentralizada”. Isso explica por que os jovens se identificam mais com influenciadores de notícias, que apresentam conteúdos de maneira personalizada e adaptada ao seu universo de interesses.
Além disso, o formato das redes sociais favorece a disseminação de conteúdos virais, tornando os news influencers uma peça-chave na formação da opinião pública. Muitos desses influenciadores são mais do que meros repórteres digitais: posicionam-se como analistas, críticos sociais e até activistas políticos, aumentando a sua influência sobre o público jovem.
Desafios e Problemas Éticos: Credibilidade, Desinformação e Regulação
Embora os news influencers tenham contribuído para democratizar o acesso à informação, a sua ascensão também apresenta riscos consideráveis, especialmente no que diz respeito à credibilidade e à propagação de notícias falsas. Diferentemente do jornalismo profissional, que segue princípios de verificação e imparcialidade, os influenciadores muitas vezes operam sem regulamentação, podendo propagar desinformação ou conteúdos tendenciosos.
Um dos principais problemas desse modelo é a disseminação de fake news, especialmente em contextos eleitorais ou de crises sociais. Segundo McChesney (2015), em Rich Media, Poor Democracy, “a comercialização da informação e o poder dos algoritmos tendem a priorizar conteúdos sensacionalistas e polarizadores, reduzindo o espaço para reportagens aprofundadas e analíticas”. Como os news influencers dependem do engajamento do público para monetizar os seus conteúdos, há uma tendência de privilegiar manchetes chamativas e discursos polémicos, em detrimento da informação equilibrada e factual.
No contexto angolano, onde o Estado Democrático de Direito ainda se encontra em processo de consolidação, é fundamental que existam mecanismos legais e fiscalizadores para regular a actividade dos news influencers e a disseminação de informações nas plataformas digitais. A liberdade de expressão, princípio basilar da democracia, deve ser garantida, mas não pode servir de escudo para a propagação de fake news, discursos de ódio e manipulação política. Assim, torna-se urgente a criação de políticas públicas que incentivem a transparência na comunicação digital, assegurem a responsabilização de influenciadores que divulgam informações falsas e promovam a literacia mediática entre os cidadãos. No entanto, esse controlo deve ser feito com equilíbrio, evitando qualquer forma de censura que comprometa o pluralismo informativo e a participação cidadã, elementos essenciais para o fortalecimento da democracia angolana.
O Futuro do Jornalismo na Era dos Influenciadores
Diante desta realidade, qual será o futuro do jornalismo? A resposta não está na extinção do modelo tradicional, mas na sua adaptação. Muitos veículos de comunicação já estão a incorporar estratégias digitais para competir com os news influencers, utilizando redes sociais e vídeos curtos para atrair o público jovem.
Segundo Clay Shirky (2010), em Cognitive Surplus, “o futuro do jornalismo não está no controlo da informação, mas na capacidade de criar comunidades de leitores engajados e críticos”. Isso significa que os meios de comunicação precisarão evoluir para garantir que o público tenha acesso a informações credíveis num ambiente cada vez mais fragmentado.
Além disso, é essencial investir na educação digital e na formação do senso crítico para que as novas gerações saibam distinguir notícias bem fundamentadas de conteúdos tendenciosos ou manipuladores. Ferramentas como a verificação de factos e iniciativas de literacia mediática podem desempenhar um papel fundamental nesse processo.
Finalmente, o surgimento dos news influencers representa uma mudança irreversível no consumo de notícias, especialmente entre os jovens da Geração Z. Eles trouxeram dinamismo, interactividade e novas formas de engajamento com a informação, mas também levantaram desafios éticos e sociais que não podem ser ignorados.
Se, por um lado, a descentralização da informação ampliou a diversidade de vozes no debate público, por outro, a ausência de controlo e regulamentação pode comprometer a credibilidade e a qualidade das notícias. O futuro do jornalismo dependerá da capacidade dos meios tradicionais de se reinventarem e do esforço da sociedade para promover uma cultura informativa mais crítica e responsável.