Análise
Município do Lubango sem combustível: a logística que enterra a competitividade e menospreza o cidadão
1. Introdução: O mito do produto que se vende sozinho
Durante muito tempo acreditou-se que bastava um bom produto para garantir vendas e sucesso. Essa ideia, hoje, não resiste à realidade. O mercado tornou-se exigente, informado e impiedoso. O consumidor, seja ele angolano ou estrangeiro, não procura apenas o produto em si, mas sim um pacote completo: qualidade, preço justo e, sobretudo, serviços logísticos que assegurem disponibilidade, entrega eficiente e acompanhamento pós-venda.
Na era da globalização e da hipercompetitividade, já não basta produzir; é preciso saber entregar. E é nesse ponto que a logística deixa de ser um detalhe operacional para se afirmar como diferencial competitivo e determinante da satisfação do cliente.
2. Logística: de função invisível a pilar estratégico
Quando falamos em produto, serviço e logística, compreendemos que a logística, em qualquer empresa de bens de consumo ou industrializados, é essencialmente um fornecedor de serviços.
No sector de consumo, o que pesa são prazos e confiabilidade de entrega.
No sector industrial, os critérios logísticos estão voltados ao suporte técnico, fornecimento de peças de reposição e manutenção.
Ou seja, o esforço de todas as actividades logísticas converge para um mesmo objectivo: garantir o serviço ao cliente.
3. Serviço ao cliente: o coração da competitividade
É minha convicção que o serviço ao cliente, suportado pela logística, é hoje um dos principais elementos da vantagem competitiva sustentável. Michael Porter já havia sistematizado, nos anos 1980, três estratégias fundamentais:
1. Liderança em custos – reduzir custos por meio de processos mais eficientes e conhecimento acumulado.
2. Diferenciação – criar exclusividade valorizada pelo mercado, como entregas mais rápidas ou rastreio digital em tempo real.
3. Foco – excelência no atendimento, garantindo proximidade e confiança.
Cada uma destas estratégias encontra na logística um terreno fértil para florescer. A empresa que domina a arte da entrega eficiente, transparente e confiável, domina também a preferência do cliente.
4. O caso do Lubango: logística que falha, dignidade que se perde
Se dúvidas ainda houvesse sobre a relevância da logística, basta observar o que se passa em Angola, mais precisamente na província da Huíla, cidade do Lubango. Nos últimos dias, a população tem enfrentado escassez de combustível, gás butano e energia eléctrica. O impacto é devastador:
Filas intermináveis para abastecer;
Atrasos em actividades económicas e sociais;
Crescente revolta popular.
Enquanto a ENDE se esforça em justificar os apagões, no que toca ao combustível e ao gás, as instituições têm mantido um silêncio ensurdecedor. Esse vazio de comunicação só agrava a insatisfação. Um morador desabafou:
“Estamos cansados de viver nesta incerteza, sem luz, sem gás e sem saber quando haverá combustível”.
A situação atingiu um ponto insustentável quando, durante uma gala, a Delegada Regional Sul da Sonangol, Mónica Alves, foi questionada pelo jornalista Sérgio Rodrigues sobre a crise. A resposta, no mínimo infeliz, foi:
“O abastecimento está a ser feito… só há fila quando há combustível…”.
Ora, esta declaração, em vez de apaziguar, aumentou a frustração popular e expôs a incapacidade de comunicação e de respeito institucional.
5. Quando a falha logística mina a confiança social
O episódio do Lubango é paradigmático: a logística, quando falha, não compromete apenas a economia ou a imagem de uma empresa; compromete a vida das pessoas e a confiança social. Energia, combustível e gás não são artigos de luxo; são bens essenciais à dignidade humana e ao funcionamento básico de qualquer sociedade.
A ausência de soluções logísticas eficazes e de uma comunicação transparente transforma-se num problema de governação. E aqui está o ponto central: a logística deixou de ser um mero processo técnico para tornar-se uma questão política e social.
6. Soluções logísticas para o caso do Lubango
Para enfrentar a crise e evitar que episódios semelhantes se repitam, é necessário adoptar medidas concretas e sustentáveis. Eis algumas sugestões:
1. Reforço das infra-estruturas de armazenamento: construir ou ampliar depósitos de combustível e gás na região Sul, garantindo reservas suficientes para responder a picos de procura.
2. Gestão de stocks com base em dados: utilizar sistemas de monitorização digital que permitam prever consumos, antecipar escassez e planear melhor o abastecimento.
3. Diversificação das rotas de abastecimento: criar alternativas logísticas (rodoviárias e ferroviárias) que reduzam a dependência de um único canal de transporte, aumentando a resiliência da cadeia de suprimento.
4. Comunicação transparente com a população: informar com antecedência sobre falhas, planos de reposição e prazos de normalização. O silêncio institucional gera desconfiança e instabilidade social.
5. Parcerias público-privadas no sector energético: estimular a participação do sector privado na distribuição e logística de combustíveis e gás, criando maior concorrência e eficiência no serviço.
6. Investimento em energias alternativas: apostar na diversificação da matriz energética (solar, hídrica, eólica), reduzindo a dependência de sistemas frágeis e sobrecarregados.
7. Competitividade em Angola: lições a tirar
Se Angola quer afirmar-se como um país competitivo, capaz de atrair investimentos e garantir qualidade de vida aos seus cidadãos, precisa compreender que:
Logística é competitividade – sem ela, não há economia funcional.
Serviço ao cliente é confiança – e confiança é capital social.
Comunicação é respeito – o silêncio institucional mina ainda mais a credibilidade.
As empresas e instituições públicas que souberem integrar redução de custos, diferenciação por qualidade e foco no atendimento, não só conquistarão clientes, mas também recuperarão a confiança de uma população cansada de improvisos.
8. Conclusão: o que se vende é importante, mas o que se entrega é decisivo
Na minha opinião, o verdadeiro diferencial competitivo do nosso tempo não reside apenas na capacidade de produzir ou de publicitar produtos, mas sim na arte de entregar com competência. O caso do Lubango é um alerta: sem logística eficiente e sem serviço ao cliente, não há competitividade, não há desenvolvimento e não há dignidade.
O produto pode chamar atenção; a publicidade pode encantar; mas é o serviço, sustentado pela logística, que conquista, fideliza e assegura confiança.
No final, não é apenas “o que se vende” que conta, mas “como se entrega”.