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Mulheres em negócios em Angola: falta de oportunidade ou de coragem para arriscar?
O empreendedorismo tem sido um dos principais motores do desenvolvimento económico global, e Angola não é excepção. No entanto, quando analisamos a participação das mulheres neste sector, percebemos desafios estruturais que ainda limitam o seu protagonismo. Em Angola, o empreendedorismo feminino tem crescido, especialmente em áreas como o comércio informal, a moda, a tecnologia e o turismo. Contudo, as mulheres enfrentam barreiras culturais, institucionais e financeiras que dificultam a expansão dos seus negócios.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT, 2019) aponta que, em países em desenvolvimento, as mulheres empreendedoras enfrentam dificuldades adicionais em relação aos homens, especialmente no que concerne ao acesso a financiamento, redes de negócios e credibilidade no mercado. Em Angola, essa realidade manifesta-se de forma ainda mais intensa devido a factores históricos e culturais. Este artigo visa analisar os principais desafios enfrentados pelas mulheres empreendedoras no país e apresentar caminhos possíveis para a superação desses obstáculos.
1. Barreiras Culturais: O Peso da Tradição na Trajectória Feminina
A cultura desempenha um papel determinante na construção do cenário empreendedor feminino. Segundo Hofstede (2001), as sociedades com elevados índices de masculinidade tendem a reforçar papéis tradicionais de género, limitando a presença das mulheres em áreas consideradas de maior protagonismo económico. Angola, tal como muitas nações africanas, ainda carrega resquícios de uma estrutura patriarcal, na qual a mulher é, muitas vezes, vista como a principal responsável pelas tarefas domésticas e pelo cuidado dos filhos.
Essa visão tradicional impõe desafios significativos à ascensão feminina no empreendedorismo. Em muitos casos, a família e a comunidade não encorajam as mulheres a dedicarem-se a negócios, pois isso pode ser visto como uma ameaça ao equilíbrio social estabelecido. Além disso, a falta de apoio dentro da própria família faz com que muitas mulheres empreendedoras enfrentem dificuldades emocionais e financeiras para consolidarem as suas empresas.
De acordo com estudos da ONU Mulheres (2020), a sub-representação feminina em posições de liderança e gestão empresarial não se deve à falta de competência, mas sim a normas sociais que restringem o acesso das mulheres a oportunidades económicas e de desenvolvimento profissional. Esse fenómeno é evidente em Angola, onde a presença feminina nos sectores formais da economia ainda é reduzida, apesar do protagonismo das mulheres no comércio informal.
2. A Dificuldade de Acesso ao Crédito e Recursos Financeiros
O acesso ao financiamento é um dos principais desafios enfrentados pelas empreendedoras angolanas. Segundo Bruhn e McKenzie (2018), as mulheres geralmente encontram mais dificuldades do que os homens para obter crédito, seja por discriminação estrutural do sistema financeiro ou pela ausência de garantias patrimoniais exigidas pelas instituições bancárias.
Em Angola, muitas mulheres não possuem bens registados em seus nomes, o que dificulta a obtenção de empréstimos bancários. Além disso, os programas de microcrédito e financiamento empresarial disponíveis nem sempre são adequados às necessidades das mulheres empreendedoras, sendo muitas vezes desenhados para modelos de negócios tradicionalmente masculinos.
De acordo com um relatório do Banco Mundial (2021), países que implementaram políticas de incentivo ao crédito para mulheres empresárias observaram um crescimento significativo no número de negócios liderados por elas, além de um impacto positivo na economia local. No entanto, sem esse suporte, muitas mulheres angolanas recorrem a sistemas informais de financiamento, como as kixikilas (associações comunitárias de poupança e empréstimo), que, apesar de ajudarem a curto prazo, não garantem um crescimento sustentável para os negócios.
3. Oportunidades e Caminhos para o Sucesso do Empreendedorismo Feminino em Angola
Embora os desafios sejam inúmeros, há caminhos promissores que podem fortalecer o empreendedorismo feminino e permitir que as mulheres assumam um papel mais activo no desenvolvimento económico de Angola. Algumas estratégias fundamentais incluem:
3.1. Educação e Capacitação para Empreendedoras
A formação académica e profissional é um factor determinante para o sucesso dos negócios femininos. Segundo Drucker (2015), o empreendedorismo não é apenas uma questão de talento inato, mas uma habilidade que pode ser aprendida e desenvolvida. Assim, investir em programas de capacitação voltados para mulheres empreendedoras pode ser um diferencial importante.
Iniciativas como workshops de gestão financeira, marketing digital e liderança feminina podem ajudar a reduzir a lacuna de conhecimento e fornecer ferramentas práticas para as mulheres estruturarem melhor os seus negócios. Além disso, o acesso a mentorias com empresárias experientes pode proporcionar um aprendizado mais direccionado e inspirador.
3.2. Fortalecimento das Redes de Apoio e Associativismo
As redes de apoio são fundamentais para o crescimento de qualquer empreendimento. Segundo Granovetter (1973), as conexões interpessoais têm um impacto directo nas oportunidades de negócios e no acesso a recursos. Para as mulheres empreendedoras, a criação de associações e grupos de networking pode ser uma solução eficiente para fortalecer a presença feminina no mercado.
Organizações que incentivam a colaboração entre empreendedoras podem facilitar o compartilhamento de experiências, parcerias estratégicas e oportunidades de negócios. Além disso, essas redes podem servir como espaços para reivindicações políticas e económicas, pressionando por melhores condições para o empreendedorismo feminino.
3.3. Políticas Públicas e Incentivos Governamentais
O Estado tem um papel crucial na promoção do empreendedorismo feminino. Em países como o Ruanda e o Gana, políticas públicas voltadas para mulheres empreendedoras resultaram no aumento da participação feminina na economia e na criação de negócios inovadores.
Para Angola, algumas medidas estratégicas poderiam incluir:
Programas de financiamento acessíveis e com condições especiais para mulheres empreendedoras;
Incentivos fiscais para negócios liderados por mulheres;
Criação de incubadoras de startups femininas;
Maior representatividade feminina nas instituições que regulam o sector empresarial.
Com um ambiente regulatório mais favorável, as mulheres terão mais oportunidades para expandirem os seus negócios e contribuírem para o crescimento económico do país.
Finalmente, o empreendedorismo feminino em Angola enfrenta desafios estruturais que vão desde barreiras culturais até dificuldades financeiras. No entanto, como demonstrado ao longo deste artigo, há caminhos para superar esses obstáculos e fortalecer a participação das mulheres no sector empresarial.
A mudança passa pela criação de um ambiente mais inclusivo e pela implementação de políticas públicas que incentivem o desenvolvimento dos negócios femininos. Além disso, investir na formação e no fortalecimento das redes de apoio pode garantir que mais mulheres consigam transformar as suas ideias em empreendimentos sustentáveis.
Como argumenta Yunus (2007), Prémio Nobel da Paz e criador do microcrédito, “quando uma mulher tem acesso a oportunidades económicas, toda a sociedade prospera”. Assim, apoiar o empreendedorismo feminino em Angola não é apenas uma questão de equidade de género, mas uma estratégia fundamental para o progresso do país.
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