Análise

MPLA retira Carolina. UNITA eleva Navita. Pura Coincidência?

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1. Introdução: Uma mudança de tabuleiro na política angolana

As recentes movimentações internas da UNITA, associadas às alterações promovidas pelo MPLA na Assembleia Nacional, redesenham profundamente o mapa político angolano. De um lado, a UNITA reforça a sua direcção com a nomeação de Liberty Chiyaka como Secretário-Geral e com a ascensão de Navita Ngolo, mulher, jovem e de perfil combativo, à presidência do Grupo Parlamentar. Do outro lado, o MPLA retira uma mulher da Presidência da Assembleia Nacional ao substituir Carolina Cerqueira por Adão de Almeida.

Este contraste simbólico não passa despercebido. Como lembra a cientista política Pippa Norris, “os partidos enviam sinais poderosos sobre inclusão não apenas através de discursos, mas através de quem escolhem colocar no comando”. Neste momento, a UNITA envia um sinal de renovação e inclusão, ao passo que o MPLA reconfigura o topo da hierarquia legislativa num movimento interpretado por muitos como um recuo na representatividade feminina.

2. O reforço do centro de decisão da UNITA com a entrada de Liberty Chiyaka

A subida de Liberty Chiyaka à função de Secretário-Geral representa uma aposta na profissionalização da estrutura partidária. Saindo da liderança do Grupo Parlamentar, Chiyaka passa a gerir toda a máquina política interna, concentrando responsabilidades de articulação nacional e operacionalização estratégica.

Max Weber afirmava que “a força de uma organização depende da racionalidade das suas estruturas e da competência dos seus gestores”. Ao colocar Chiyaka no núcleo decisório, a UNITA pretende consolidar disciplina, planificação e eficiência política.

Este movimento revela que o partido está consciente da importância da organização interna para enfrentar futuros ciclos eleitorais e para se afirmar como alternativa sólida ao poder.

3. Navita Ngolo como afirmação feminina num Parlamento historicamente masculino

A nomeação de Navita Ngolo para presidir o Grupo Parlamentar da UNITA tem uma importância que ultrapassa as fronteiras partidárias. O gesto possui três dimensões essenciais.

Primeiro, simboliza uma renovação geracional. Como refere Norberto Bobbio, “a vitalidade política exige a entrada de novas gerações no comando das instituições”.

Segundo, representa um avanço significativo para a representação feminina. A política angolana continua marcada por desigualdades de género, e a ascensão de uma mulher à liderança parlamentar de um dos principais partidos revela coragem estratégica e sensibilidade social.

Terceiro, evidencia a escolha de um quadro com capacidade técnica, firmeza e visão política. Navita Ngolo tem demonstrado maturidade, assertividade e qualidade discursiva num Parlamento cada vez mais exigente e confrontacional.

Num ambiente institucional onde a presença feminina ainda está distante das metas internacionais, esta nomeação representa um marco importante.

4. O movimento do MPLA e a saída de Carolina Cerqueira

Enquanto a UNITA eleva uma mulher a um dos seus cargos mais visíveis, o MPLA toma a decisão de retirar a única mulher que ocupava o mais alto posto da Assembleia Nacional. Carolina Cerqueira, que assumia a Presidência da Assembleia e era uma das figuras femininas mais influentes no aparelho do Estado, é substituída por Adão de Almeida.

Ainda que a decisão seja apresentada como reorganização interna, o impacto simbólico é profundo. A saída de Carolina Cerqueira reduz a representatividade feminina no topo da estrutura legislativa, exactamente no momento em que a oposição reforça essa presença.

A cientista política Margaret Phillips observa que “quando mulheres saem de posições de topo, a mensagem implícita é tão importante quanto a decisão em si, porque revela prioridades e hierarquias de género dentro das elites políticas”.

O contraste é evidente. A UNITA avança e o MPLA recua.

5. O Parlamento como arena central das disputas políticas

A Assembleia Nacional tornou-se, nos últimos anos, a principal arena da disputa política angolana. Como recorda Robert Dahl, “as instituições legislativas são espelhos das forças políticas e sociais que disputam influência numa democracia”.

As alterações simultâneas nos dois principais partidos demonstram que:

* o Parlamento adquiriu centralidade estratégica
* a disputa pela legitimidade passa pela qualificação dos quadros políticos
* a inclusão de mulheres e jovens torna-se um factor diferenciador

A presença de Navita Ngolo reforça a imagem de uma oposição mais moderna, mais plural e alinhada com as exigências do eleitorado contemporâneo. A substituição de Carolina Cerqueira, em contrapartida, surge como uma leitura menos progressista por parte do partido no poder.

6. UNITA, inclusão e modernização num tempo de exigências sociais crescentes

Ao escolher uma mulher para liderar o seu Grupo Parlamentar, a UNITA demonstra abertura, sensibilidade política e entendimento das dinâmicas sociológicas de Angola. Aproxima-se das mulheres, que compõem a maioria do eleitorado, e responde às expectativas dos jovens, que reclamam renovação e legitimidade.

Pippa Norris sintetiza esta necessidade ao afirmar que “a modernização política exige diversidade e a diversidade começa pela liderança”.

Navita Ngolo simboliza esta modernização. A sua chegada ao comando parlamentar sinaliza a entrada de uma nova geração e reforça o compromisso da UNITA com um perfil de liderança mais equilibrado, representativo e inclusivo.

7. Conclusão: entre o recuo do MPLA e o avanço da UNITA, desenha-se uma nova paisagem política

A conjugação das recentes decisões dos dois maiores partidos coloca a política angolana diante de um novo cenário. De um lado, a UNITA fortalece-se com uma aposta simultânea na competência técnica, na renovação geracional e na representatividade feminina. Do outro lado, o MPLA afasta uma mulher do topo da Assembleia Nacional, contrariando a tendência global de inclusão e simbolicamente reduzindo a presença feminina em cargos de visibilidade elevada.

Como lembrava Samuel Huntington, “as elites que não se adaptam às exigências do seu tempo perdem o seu lugar na história”. Neste momento, a UNITA parece adaptar-se com maior rapidez.

O sinal político está dado. A disputa pela legitimidade passa cada vez mais pela capacidade de representar o país real. A UNITA percebeu isso. E isso altera o jogo político nacional.

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