Economia
Ministério das Finanças rejeita responsabilidades sobre falência de empresas privadas
O Ministério das Finanças negou ter responsabilidades sobre a falência das empresas privadas, atirando culpas aos empresários que aceitam participar em esquemas de falsificação de dívidas e tráfico de influência.
A secretária de Estado do Orçamento, Aia-Eza Silva, rebateu assim as críticas de lideres de associações empresariais, empresários privados, nacionais e estrangeiros, banqueiros e gestores, no primeiro ‘almoço conferência’ do jornal Expansão, que debateu as linhas de fundamentação do Orçamento Geral do Estado (OGE).
De acordo com os empresários, os atrasos do Estado “contribuem para a redução ou falência das pequenas e médias empresas que fornecem bens e serviços ao Governo”.
Já Aia-Eza Silva garante que as acusações “não são verdadeiras”, argumentando que, parte das dívidas que chega ao Ministério das Finanças, “não tem documentação, nem certificação”.
“A dívida que o Estado contrai com os bancos está totalmente bem documentada. Está em livros, tem registos. Há dívidas que são de fornecedores de bens e serviços ao Estado. Quando bem documentadas, temos consciência de que existe. E há dívida que fornecedores de serviços prestam ao Estado, na base do amiguismo, coleguismo, de tudo menos instrumentos de despesas explícitas”, defendeu-se.
A governante garantiu que, “numa boa parte dos casos”, o Ministério “nem sabe da existência dessas dívidas”. “Não fizeram périplo que a despesa pública deve cumprir para que exista”, denunciou, quando contrariava, em resposta, a vice-presidente da Associação Agropecuária, Comercial e Industrial da Huila, Filomena Oliveira.
Aia-Eza Silva deu exemplos de governantes que incluem na classificação de dívida iniciativas dos governos provinciais, como almoços, visitas de delegações governamentais ou de entidades privadas, num esquema entre o empresário do restaurante e lideres das províncias. “Posso dar um exemplo que acontece muito no nosso país. Há uma actividade governamental que vai fazer deslocar entidades públicas ou privadas às províncias. E vai haver um almoço para essas entidades. Solicita-se a um empresário que sirva. Esse empresário nunca recebeu uma nota de cabimentação dessa despesa. A este empresário, nunca foi emitida uma ordem de saque, mas, para ele, tem uma dívida a cobrar ao Estado”, aponta. Para o Estado, prossegue, “essa dívida não é cobrada. Então, muita da dívida que é reclamada como dívida ao Estado, não tem documentação”.
São esses atrasos que, segundo Filomena Oliveira, contribuem para a falência de vários negócios, posição que, aliás, foi corroborada pelo congénere da Associação Industrial de Angola (AIA), José Severino, que expôs uma lista ‘sem fim’ de empresas dadas como encerradas em anúncios no Jornal de Angola.
Falência por dívida ao Fisco
Por seu turno, Aia-Eza garantiu que parte das empresas anuncia o encerramento “como mecanismo de fuga ao fisco”. Ou seja, “declaram falência, problemas técnicos, para, no dia seguinte, criarem outra entidade com os mesmos activos da empresa dada como encerrada”.
“Há várias empresas a fechar, porque não têm os pagamentos que lhes são devidos. Porque a economia teve mesmo um ponto baixo. E isso é natural que aconteça, porque as economias quando têm crise, as pequenas e médias empresas são as primeiras a sofrer. Há empresas a fechar por causa desse processo de dívidas que se acumulou, não só por parte do Estado, mas por parte dos privados. Mas há muitas empresas que fecham porque não querem liquidar impostos. Declararam falência, problemas técnicos, fecham e, no dia seguinte, os sócios voltam a abrir outra empresa diferente, tudo para se livrarem dos impostos”, reforçou a secretária de Estado.
Governo preocupado
Apesar das denúncias de esquema de corrupção e tráfico de influência na classificação das dívidas, Aia-Eza admite que o Governo “está preocupado” com a situação da falência, reconhecendo também que é, em parte, por causa dos atrasos na liquidação de contas pelo Estado. “Em relação à regularização das dívidas das pequenas e médias empresas, tem sido uma questão que nos tira o sono”, enfatizou. “Infelizmente, não temos um país cheio de dinheiro. As nossas reservas internacionais líquidas são, hoje, pouco mais de 13 mil milhões de dólares. Isto é, 10% do PIB. Não sei quem dá essa perspectiva de que temos um país cheio de dinheiro, mas, provavelmente, não sou eu, nem posso ser eu, porque sou a pessoa que tem de cortar despesas, sou a que tem de dizer não aos órgãos. Sou uma das pessoas no Governo que é muito odiada, porque digo ‘não’, porque não temos um país cheio de dinheiro”, disse Aia-Eza.
Apesar das criticas dos empresários, a secretária de Estado do Orçamento assegurou que, no ano passado, o Governo fez “um esforço tremendo de pagamento de uma parte da dívida”. “Não se conseguiu pagar tudo, porque se estabeleceu um critério: a dívida até 500 milhões de kwanzas foi paga imediatamente, desde que devidamente certificada. A dívida acima dos 500 milhões é que não conseguimos pagar, por questões de tesouraria”.