Crónica ideal ao Domingo

Jovens em Angola: presos pela caverna do conformismo

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Platão, no seu famoso mito da caverna, narrava a história de homens acorrentados desde o nascimento num espaço subterrâneo, forçados a ver apenas sombras projectadas na parede. Para eles, aquelas sombras eram a realidade. Até que um deles se liberta, sai e vê o sol, a luz da verdade, percebendo que o que antes julgava ser real não passava de uma ilusão.

Mais de dois mil anos depois, a parábola mantém-se viva e, em Angola, parece ganhar novas formas. A nossa caverna já não é feita de pedra e escuridão física, mas de ignorância social, manipulação informacional, desemprego estrutural e conformismo geracional. Muitos jovens aprendem a viver da sombra, não da luz, vivendo do favoritismo, da dependência, da aparência e da sobrevivência.

Como alertou o filósofo queniano John Mbiti, “eu sou porque nós somos; e, porque nós somos, eu sou”. No entanto, a juventude angolana tem sido condicionada a uma lógica inversa: “eu sou se eu tiver”. O ter substituiu o ser, e a essência humana foi trocada pela aparência social.

As novas cavernas estão nas redes sociais, nas universidades sem visão crítica e nas políticas públicas que prometem inclusão mas produzem exclusão. Muitos jovens confundem popularidade com sabedoria, fama com mérito e activismo com transformação real. É a era das sombras digitais, onde se acredita saber porque se lê rápido e se acha livre porque se comenta muito.

O pensador africano Cheikh Anta Diop dizia que “a libertação de África passa pela libertação da mente africana”. Sair da caverna, neste contexto, significa libertar-se mentalmente do sistema que domestica, aliena e anestesia. Significa compreender que o Saber não é acumular informações, mas aprender a pensar; que o Fazer não é apenas executar, mas agir com propósito; que o Ser é cultivar valores éticos e comunitários; e que o Saber-Ssber é o ápice da consciência, o saber que se reconhece e se responsabiliza.

Platão ensinava que o primeiro contacto com a luz é doloroso. Em Angola, o jovem que decide sair da caverna é aquele que questiona o sistema, que recusa o conformismo e que tenta construir o seu caminho fora da sombra do poder. Esse jovem é criticado, marginalizado, às vezes silenciado, porque, como na parábola, quem vive nas sombras sente-se ameaçado por quem começa a ver.

Mas é essa juventude desperta que carrega o futuro. É ela que precisa assumir o papel de nova elite intelectual e moral, capaz de unir saber técnico e consciência ética, de transformar conhecimento em acção e indignação em soluções. A saída da caverna não é um acto individual, é um movimento colectivo de iluminação. Como dizia Amílcar Cabral, “as armas da luta libertadora são, antes de tudo, as ideias”.

Angola precisa de jovens que saibam pensar, fazer, ser e Saber-Ssber. Jovens que compreendam que a educação é a verdadeira revolução, que o carácter é a base da liderança e que a solidariedade é a forma mais elevada de sabedoria. O país não mudará enquanto a juventude continuar a confundir a sombra do sucesso com a luz do conhecimento. Sair da caverna é o primeiro passo da emancipação. Iluminar o caminho dos outros é o dever dos que já viram o sol.

Portanto, a geração que ainda não saiu da caverna não é a que falta de oportunidades, mas a que tem medo da luz, a luz da verdade, da coragem e da responsabilidade. A revolução que Angola precisa começa dentro da mente de cada jovem disposto a ver o mundo sem filtros, a pensar sem medo e a agir com propósito.

Porque a caverna não é um lugar físico, é um estado mental. E o Saber-Ssber é a chave que abre a saída.

*Imagem criada com uso de Inteligência Artificial 

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