Opinião
Já não pode caminhar para frente este país, enquanto se não cortar todo o mal pela raiz
1ª part.
Um nacionalista, um angolano já o escreveu e pensou em Abril de 1901, “já não pode caminhar para a frente este país, enquanto se não cortar todo o mal pela raiz”, no famoso livro publicado na mesma data da reflexão. Um livro constituído por onze (11) temas e transcrições. Esta obra possui 183 páginas e, foi uma oferta dos amigos da verdade, os naturaesde Angola, com título “A VOZ DE ANGOLA CLAMANDO NO DESERTO”. Portanto, constitui uma relíquia, mas pouco conhecido da maioria dos angolanos das novas gerações e por alguns da velha geração. Esta obra faz parte, portanto, da história política, social e cultural de Angola, e faz recordar os importantes acontecimentos que o povo angolano era submetido na época colonial e a perspectiva futurística que os activistas, os filhos da pátria tinham em relação a sua terra, o sonho da liberdade e, deixa cair em terra a perspectiva presunçosa de que o povo angolano é «UM POVO PASSIVO» em relação a opressão, a desumanidade, a desgovernação da sua pátria, do seu país e do seu povo.
Esta obra fora publicada por intelectuais angolanos sob anonimato, isto por razões que a opressão feroz e desumana se justificava na altura pela colonização portuguesa. Nela fora publicada vários textos de protesto cultural, social e político. Sendo uma obra de carácter colectivo, participaram onze (11) activos intelectuais da época, e mais curioso, maior parte deles, eram autodidactas, mas possuíam um sentimento efervescente de nacionalismo, amor profundo pela sua pátria e o seu povo, com finória em termos de escrita. A carga de oralidade que foi «despejada» na escrita e a voz gigante destes homens, ecoou-se em quatro cantos do mundo sobre a reportagem da repressão do sistema fascista colonial na antiga colonia portuguesa (Angola) e posteriormente a província ultramarina, época que foi marcada pelos cânticos dos homens da PIDE/DGS, “Angola é nossa” e a máquina de trituração dos verdadeiros filhos desta pátria que se chama Angola, estava na sua “doçura” e ansiava por sangue.
Estes activos activistas, angolanos até a espinha dorsal, nacionalistas de primeira vaga, homens de coragem, sonhadores da liberdade. Homens como Paschoal Jé Martins, Mário Castanheira Nunes, António José do Nascimento, Augusto Silvério Ferreira, José Carlos de Oliveira Nunes, Apolinário Van-Dúnem, Carlos Botelho de Vasconcelos, João Almeida Campos, Carlos Saturnino, Eusébio Velasco Galiano Júnior e Francisco das Necessidades CastelBranco, nomes que a nova geração de patriotas têm a obrigação de recordar e erguer com brio e respeito. Todos eles pertenciam ao um amplo movimento denominado por naturaes.
11 Punhos Cerrados: Princípio da Revolução Angolana e o Brotar das Primeiras Sementes Nacionalista
A activação da acção reivindicativa dos naturaesfoi a publicação de um texto (artigo) n.º 4 que a redacção do jornal a Gazeta de Loanda, em 21 de Março de 1901, por sinal o único jornal que então aí na época se publicava pós perfilhar nas ruas. O artigo tinha como titulo «Contra a Lei, pelaGrey», cujo titular do texto manifestava o mais «absurdo» e gritante reaccionarismo colonialista contra o povo angolano. Afirmando neste texto, a necessidade de subalternização ou subalternidade do negro (indígena) em relação ao branco (colonialista) e negando àquele o mais elementar dos direitos: o direito de fazer parte da humanidade. Segundo o articulista e escriba, no seu querer propagandear os laços da fraternidade lusitana, procurou intencionalmente ludibriar e inferiorizar a raça (negra) sem receio da indignação dos naturais, a fim de levar ou persuadir os poderes públicos coloniais na altura, decretar medidas antipolíticas e anti-humana.
Para este articulista e escriba luso, tentava cultivar aos seus patrícios (colonos) com pensamentos erróneos que“(…)O preto (negro) não trabalha, o preto (negro) não é perfeitamente homem; pelosdelitos que cometem, não devem ser condenados à cadeia, basta dar-lhepalmatoadas, ou deporta-lo, sem figura nenhuma de juízo. (…) Poisqual é o ideal do preto senão comer sem trabalhar? Qual é a sua lei,a sua norma de vida, o seu superior anseio? Não somos apologistas dos castigos corporais, Achamo-los uma barbaridade, pelo mesmo motivo porque achamos a pena de morte um crime oficial. Mas umas palmatoadas não matam ninguém (Contra a Lei, Pela Grey in Gazeta de Loanda, n.º 4, 21 de Março de 1901)”.
A publicação deste texto provocou uma desenvoltura das paixões e excesso escandaloso das apreciações, que para os naturaesa tal perspectiva só poderia florir num desagregado cérebro enfermo, que despejava jactos de filosofia hidrópica, aluvião que ameaçava o desabamento do grande edifício social, na terra, em que nasceu o negro e o mestiço, em boa e perfeita convivência com o europeu (branco), de sentimentos fidalgos, cuja vontade suprema de todos, era o cumprimento da lei, da justiça, do reflexo fiel da justiça divina. Os naturaesnão se limitaram apenas a dar uma réplica adequada e sólida a todo sistema colonialista português em África (Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Guiné Cabo-Verde), documentada com argumentos científicos de natureza etnográfica, histórica, sociológica e política. Esta reacção cimentou a linha de outras manifestações esporádicas que se verificava na Colónia, dando terreno fértil para sementes de uma luta de resistência cívica, preservação e autenticidade cultural que, mais tarde iria ser enriquecida de conceitos político-ideológico que daria lugar à luta armada e, posteriormente, a derrota do colonialismo e a libertação do povo angolano.
A Geração de 1900 e o Tempo de Sacudir Apatia: Liceu Salvador Correia o Quartel-General dos Revolucionários
Liceu Salvador Correia, hoje baptizado por Escola Mutu-ya-Kevela, constituiu durante décadas como escola de formação de ideólogos estrategas e revolucionários angolanos. Muitos activistas (políticos) e escritores desta época que passaram neste Liceu/Escola, não deixaram muitas obras escritas, senão fragmentos das suas notas reivindicativas e artigos na imprensa alternativa cujas condições eram ideias para a expressão dos seus pensamentos libertários.
Existem razões elementares para que estes autores não deixam-se numerosas obras publicadas. O Francisco Ribeiro CastelBranco, na primeira pessoa justificou: «A primeira coisa que naturalmente ocorre é que Angola nunca teve filhos com inteligência precisa para escrever um romance ou dar à estampa uma outra obra qualquer de literatura. PURO ENGANO!/A inteligência é INATA nos angolanos, e dos escritores, filhos d’aqui, que ENCHERAM as colunas dos jornais da colónia e da METRÓPOLE com os seus veementes ARTIGOS, não havia nenhum só que não a tivesse cultivado».
Nesta mesma linha advoga Pedro Machado e Cordeiro da Matta, que: “Na verdade os males que sempre atormentaram o país, e, ao que parece, formavam, no tempo em que floresceram esses escritores (defensores da opressão colonialista), um verdadeiro flagelo, enchem de indignação todo o homem recto. E, assim, esquecidos completamente de tudo que não fosse essa benemérita missão, os angolanos não deixaram vinculados os seus nomes senão em trabalhos de mérito, sim, mas – aqui – de medíocre celebridade”. E estes célebres compatriotas terminam assim o seu olhar com apelo: “É tempo portanto de sacudirmos esta apatia que é, por assim dizer, o nosso apanágio, e darmos, nós, os NOVOS, o nosso continente às LIVRARIAS, embora escasso em número e qualidade”.
Continuação em outra edição.