Sociedade
Covid-19: luandeses “preferem estar infectados do que morrer de fome”
No primeiro dia após o Governo confirmar que já há contaminação comunitária em Luanda, a equipa do Correio da Kianda visitou algumas zonas periféricas da capital, para ouvir dos luandenses se estão a seguir correctamente as medidas de prevenção da propagação daquela que também é chamada de “inimigo invisível”.
A maioria dos entrevistados diz “temer estar infectado pela Covid-19, mas as necessidades e responsabilidades familiares obrigam-nos a enfrentarem a pandemia”.
Domingos Tchanjo, morador do bairro Panga-Panga, no Kikolo, município de Cacuaco, é moto-taxista, vulgo kupapata. Mesmo exercendo uma actividade de fácil contágio da Covid-19, diz não ter outra forma de sustentar a sua família se não fazer “motocar”.
“Eu tenho quatro filhos e fui despedido na empresa onde trabalhava. Por causa do coronavírus, a empresa teve que reduzir funcionários. Não vejo outra forma de sustentar a minha família mesmo lhes colocando em risco, através do meu trabalho”, disse e acrescentou: “vale a pena estar infectado ou morrer de Covid-19 do que morrer de fome”.
Já a senhora Madalena é zungueira há 16 anos e perdeu marido há três. Com oito filhos para criar, afirma que se não ‘zungar’, não tem como sustentar a sua família e atira-se contra o Governo pelas “falsas promessas de ajuda”, referindo-se ao auxílio de Kz 8 mil prometidos pelo Executivo.
“Não tenho marido, morreu há três anos, me deixou com oito filhos. Meu filho, se eu não ‘zungar’ os teus irmãos em casa vão morrer de fome. Sei do perigo do coronavírus, mas ficar em casa só sem nada vamos todos morrer”, exclamou, sublinhando que o Governo prometeu ajudar o povo, mas “nós nunca vimos tal ajuda se não na televisão. Depois nos dizem para ficar em casa. Se ficarmos em casa vamos comer o quê?”
O político do PRS e professor, Gaspar dos Santos Fernandes, recomenda o Executivo a redobrar as medidas de segurança para evitar a propagação da Covid-19, em particular nas famílias mais vulneráveis, apontando haver maior sensibilização:
“O Executivo deve trabalhar nas organizações para a sensibilização das populações mais vulneráveis e garantir a subsistência a elas, em fase em que o Governo perdeu controlo da pandemia”.
Segundo o político, muitos querem proteger-se da Covid-19, mas quando o que está em causa é a procura de alimentos para o sustento da família, os progenitores procuram todas as vias e muitos deles chegam a colocar a vida em risco.
Gaspar Fernandes apela à comissão de combate à Covid-19 que as paragens de táxi, os mercados ao céu aberto e os supermercados são locais de grandes riscos e que nesta fase de circulação comunitária da pandemia, requer maiores cuidados. Para ele, já é necessário a desinfecção dos locais públicos.