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Opinião

Comunicação ou campanha? Quando o gestor público se apropria das redes sociais institucionais

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Na era digital, as redes sociais tornaram-se ferramentas indispensáveis para a gestão pública para permitir maior proximidade entre governantes e cidadãos. No entanto, a dinâmica da comunicação exige uma distinção clara entre a comunicação institucional e a comunicação pessoal do gestor público, pois essa separação tem impacto directo na credibilidade, transparência e eficiência da administração. A falta dessa diferenciação pode gerar confusão na opinião pública, comprometer a imparcialidade do governo e abrir espaço para questionamentos éticos.

A comunicação institucional refere-se à transmissão de informações oficiais de um órgão público para promover políticas públicas e garantir a transparência na gestão. Segundo Costa (2011), este tipo de comunicação deve ser neutra, objectiva e voltada para o interesse público para garantir que a informação transmitida seja acessível e compreensível. Já a comunicação pessoal do gestor público envolve opiniões, interacções e reflexões individuais nas redes sociais. Para Recuero (2009), a comunicação pessoal nas plataformas digitais deve ser cuidadosamente gerida, pois pode facilmente se confundir com a comunicação oficial, especialmente quando feita por figuras públicas.

Comunicação Institucional: Representatividade e Formalidade

A comunicação institucional de um órgão público visa transmitir informações oficiais, promover políticas públicas e manter a transparência na gestão. Ela segue directrizes formais, respeitando normas de comunicação governamental e garante que os conteúdos publicados sejam de interesse público. Como observa Castells (2009), a comunicação é um dos pilares da sociedade em rede, sendo fundamental para a formação da opinião pública e a consolidação da governação democrática.

Principais características:

● Uso de perfis institucionais e canais oficiais;

● Linguagem formal e objectiva;

●Prioriza a imparcialidade e a clareza das informações;

● Responsabilidade partilhada entre a equipa de comunicação e os gestores;

● Separar realizações governamentais da imagem pessoal do gestor para evitar que conquistas da administração sejam apropriadas como realizações individuais.

Essa forma de comunicação é essencial para evitar a personificação da instituição, garantir que a gestão seja percebida como um serviço público e não como uma plataforma de autopromoção. Segundo Habermas (1989), a esfera pública deve ser um espaço de discussão racional e inclusiva, o que reforça a necessidade de separar a comunicação institucional da comunicação pessoal.

Comunicação Pessoal do Gestor Público: Limites e Riscos

Diferente da comunicação institucional, a comunicação pessoal do gestor público nas redes sociais pode envolver opiniões, reflexões e interacções directas com os cidadãos. No entanto, deve ser conduzida com cautela para evitar conflitos de interesse, desinformação ou uso inadequado da posição pública.

Principais desafios:

■ Evitar a mistura entre informações pessoais e institucionais;

■ Manter o decoro e a responsabilidade nas publicações;

■ Respeitar as directrizes éticas e legais da administração pública;

■ Garantir que a comunicação não sirva a interesses partidários indevidamente;

Evitar que conquistas da gestão sejam apresentadas como feitos pessoais do gestor, assegurando que a comunicação valorize a instituição e a equipa governamental como um todo.

Mesmo em perfis pessoais, gestores devem lembrar que as suas declarações podem ser interpretadas como posicionamentos oficiais, influenciando a percepção do público sobre a gestão. Como destaca Pierre Bourdieu (1997), o capital simbólico dos gestores públicos confere-lhes uma responsabilidade ampliada para exigir maior cuidado na forma como comunicam as suas opiniões.

Experiência Internacional e Limites Legais

Em países como o Brasil, legislações específicas regulam a comunicação dos gestores públicos nas redes sociais. A Lei de Acesso à Informação (Lei n.º 12.527/2011) estabelece a transparência como princípio fundamental, enquanto a Lei de Improbidade Administrativa (Lei n.º 8.429/1992) pune o uso indevido de recursos e canais oficiais para fins pessoais ou eleitorais. Além disso, a Lei Geral de Protecção de Dados (Lei n.º 13.709/2018) impõe restrições sobre o tratamento de dados pessoais dos cidadãos por agentes públicos.

Outros países também adoptam normativas rigorosas para evitar abusos. Nos Estados Unidos, por exemplo, há regras que proíbem o uso de contas institucionais para opiniões políticas para garantir a separação entre função pública e interesses pessoais. Na União Europeia, regulamentações sobre protecção de dados e responsabilidade na comunicação oficial também são rigorosamente aplicadas.

Poranto, a distinção entre comunicação institucional e pessoal é um imperativo para uma gestão transparente e eficaz. Ao manter perfis institucionais claros e respeitar limites na comunicação pessoal, os gestores públicos fortalecem a confiança da população na administração pública. Separar a instituição da figura do gestor evita o uso indevido da comunicação governamental para autopromoção lara garantir que o foco permaneça no interesse colectivo. Como destaca Dahl (1989), a democracia requer processos comunicativos claros e acessíveis, onde a diferença entre o público e o privado deve ser cuidadosamente preservada para assegurar a credibilidade das instituições.

Denílson Adelino Cipriano Duro é Mestre em Governação e Gestão Pública, com Pós-graduação em Governança de TI. Licenciado em Informática Educativa e Graduado em Administração de Empresas, possui uma sólida trajectória académica e profissional voltada para a governação, gestão de projectos, tecnologias de informação, marketing político e inteligência competitiva urbana. Actua como consultor, formador e escritor, sendo fundador da DL - Consultoria, Projectos e Treinamentos. É autor de diversas obras sobre liderança, empreendedorismo e administração pública, com foco em estratégias inovadoras para o desenvolvimento local e digitalização de processos governamentais.

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