Opinião
A resolubilidade das instituições financeiras bancárias
As instituições financeiras bancárias (IFB’s) podem experimentar maus momentos, consubstanciados em crises, que desencadeiam, gradualmente, efémera ou perenemente, o fim do exercício das respectivas actividades. Verificado um ou outro facto, accionar-se-ão às medidas de intervenção pública em instituições financeiras, a saber: intervenção correctiva, administração provisória e resolução.
Da impossibilidade de contornar a crise com as medidas provavelmente menos intrusivas, intervenção correctiva e administração provisória, – se quisermos recuperar o doente por via dos normais procedimentos médicos, em virtude do agravamento do quadro clínico, o paciente é encaminhado aos cuidados intensivos – entra em actuação a Autoridade de Resolução (AR).
O Banco Nacional de Angola, nestas vestes, exerce as funções de «autoridade de resolução nacional», de forma operacionalmente independente das funções de supervisão e demais funções que desempenha. Neste âmbito, pode aplicar medidas de resolução previstas na lei, nomeadamente: alienação parcial ou total da actividade a outra instituição autorizada a desenvolver a actividade em causa; transferência, parcial ou total, da actividade a uma ou mais instituições Bancárias de transição; segregação e transferência parcial ou total da actividade para veículos de gestão de activos; e recapitalização interna «bail in».
À aplicação das medidas de resolução, precede um encadeamento coerente e rigoroso de actos, a que se designa “Planeamento de Resolução”, via do qual, essencialmente, a partir de informações fornecidas pelas instituições financeiras -, se idealiza cenário hipotético de crise que suscite a intervenção da autoridade de resolução – planos de resolução -, por um lado, para avaliar a resolubilidade das instituições financeiras, por outro lado, para a identificação das estratégias/medidas preferenciais de resolução. Sendo possível distinguir, entre os aludidos propósitos, relação de dependência do segundo em relação ao primeiro.
A avaliação da resolubilidade é a averiguação de condições de exequibilidade das medidas de resolução, bem como da liquidação, tendo em conta que a institucionalização de um regime de resolução, por si só, não atende aos intentos gizados com a sua criação, pois, é necessário, sobretudo, que possam, indubitavelmente, ser aplicadas as medidas, de maneiras a assegurar a continuidade das funções críticas da IFB, evitando situações adversas à estabilidade do sistema financeiro – resolubilidade.
A resolubilidade é a tónica da resolução, se destaca, a montante, num momento em que se vislumbra, eventualmente, já haver condições de materializar quaisquer medidas casuisticamente convenientes. Daí suscitar atenção detida da autoridade de resolução, pois, qualquer lapso nesta etapa pode comprometer todo o planeamento de resolução.
O seu alcance funda-se, eventualmente, no facto de o exercício dos poderes de supervisão prudencial não se revelar suficiente e exclusivamente seguro para contornar as várias questões que os sistemas financeiros acometem, aliás, a eficiência na identificação de medidas aptas a contornar o ónus da insolvência ou falência de uma instituição financeira para o erário público, para os depositantes e para a estabilidade do próprio Sistema Financeiro.
Com a resolubilidade, objectiva-se:
- Prevenir resgates onerosos: O principal objectivo da resolubilidade de bancos insolventes é evitar que os custos de um banco em falência recaiam sobre os contribuintes, procurando assegurar uma liquidação ordenada que proteja a economia de forma mais ampla.
- Estabilidade financeira: A resolubilidade busca garantir que a insolvência de um banco não desencadeie uma crise financeira, mantendo assim a confiança no sistema bancário e financeiro.
- Proteger dos depositantes: Um dos focos é assegurar que os depositantes sejam protegidos, minimizando a perda de suas economias em caso de falência bancária.
- Manter as funções críticas: Assegurar que serviços bancários essenciais à economia continuem a ser prestados, mesmo em situações de insolvência, para não prejudicar a economia real.
- Minimizar o impacto fiscal: Reduzir o impacto que a falência de um banco pode ter sobre as finanças públicas e a economia de um país.
- Elaborar planos de resolução: Desenvolver e actualizar regularmente planos de resolução para cada banco, delineando estratégias para uma resolução eficaz em caso de insolvência.
- Remover obstáculos à resolubilidade: Identificar e eliminar barreiras que possam impedir a resolução eficiente de um banco, como complexidades estruturais ou legais.
- Definir expectativas para os bancos: Estabelecer requisitos claros para que os bancos reforcem aspectos da sua resolubilidade, como níveis adequados de capital e capacidade de absorção de perdas e garantir a continuidade de serviços críticos para a economia.
- Avaliar de forma contínua da resolubilidade: Monitorar e testar a eficácia dos planos de resolução e a capacidade dos bancos de serem resolvidos sem desestabilizar significativamente o sistema financeiro.
A avaliação da resolubilidade é realizada exclusivamente pela AR – BNA – processo integrante da elaboração e actualização anual dos planos de resolução, sendo, para tanto, necessário, garantir que as instituições financeiras tenham recursos suficientes para apoiar a medida de resolução, para assegurar a continuidade das funções críticas e haja condições de fornecimento tempestivo de informações à AR em caso de aplicação de medida. Na avaliação, teme-se, imperiosamente, como referência os aspectos elencados no n.º 2 do artigo 261.º da Lei n.º 14/21, de 19 de Maio, Lei do Regime Geral das Instituições Financeiras (LRGFI), com os quais a autoridade vai confrontar às informações fornecidas pelas IFB’s, relativas às estruturas jurídicas, societárias e operacionais, mecanismos de liquidez, mecanismos de financiamento, sistemas de informação, bem como averiguar a existência de constrangimentos à resolubilidade.
Em nosso ver, eventualmente, só se possa falar de «constrangimentos à resolubilidade», em sentido restrito, se tal for imputável a instituição financeira, no processo de avaliação da resolubilidade, tendo em atenção a subjacência da ideia de existência de facto que obste a aplicação de medida de resolução cuja culpa caiba exclusivamente a uma IFB. Se determinada situação, porém, resultar de erro na avaliação, imputável à autoridade de resolução ou a outro ente, por este arrolado ao processo, não nos parece tratar-se de constrangimento ou de efectivo constrangimento, mas de lapso (interno) na avaliação da resolubilidade. Consequentemente a identificação de constrangimentos, são accionados os mecanismos tendentes a eliminação ou mitigação dos aludidos obstáculos. Esta etapa inicia com a notificação à instituição em causa, fundamentando-se por escrito;
Na sequência, a instituição financeira bancária pode propor ao Banco Nacional de Angola possíveis medidas, que são alvo de avaliação (da eficácia). Não oferecendo estas potencial para alcançar os objectivos gizados, exige-se a adopção de medidas alternativas específicas proporcionais ao objectivo. Persistindo os constrangimentos, o Banco Nacional de Angola pode: exigir que a instituição financeira bancária preste informação adicional, pontual ou periódica, que seja relevante para efeitos da resolução; exigir que a instituição financeira Bancária proceda à alienação de activos específicos; exigir que a instituição financeira bancária limite ou cesse actividades específicas, já em curso ou previstas; restringir ou proibir o desenvolvimento de linhas de negócio novas ou existentes ou a venda de produtos novos ou existentes; exigir alterações das estruturas jurídicas, económicas ou operacionais da instituição financeira bBancária, ou de qualquer entidade do grupo controlada directa ou indirectamente, de modo a reduzir a sua complexidade e assegurar que as funções críticas possam ser jurídicas, económica e operacionalmente separadas das demais funções através da aplicação de medidas de resolução.
As medidas referenciadas, entretanto, não denotam suficiente abrangência em relação ao rol exaustivo de aspectos a ter em conta, constantes do n.º 2 do artigo 261.º da LRGIF, pelo que, a própria lei habilita a AR a estabelecer por diploma legal de dignidade normativa inferior ou no mesmo, em caso de revisão – presumimos -, outras medidas para eliminar ou mitigar os constrangimentos à resolubilidade.
Referir, igualmente, a necessidade de consulta previa do Banco Nacional de Angola, em caso de a instituição financeira bancária exercer actividade de intermediação financeira ou emitir instrumentos financeiros admitidos à negociação em mercado regulamentado, ao Organismo de Supervisão do Mercado de Valores Mobiliários, sobre o impacto das medidas no desenvolvimento dessas actividades. Por outro lado, condiciona-se a elaboração dos planos de resolução a aceitação das medidas destinadas a mitigar ou quando, adoptadas medidas alternativas especificas, sejam os constrangimentos resolvidos; aliás, pode a autoridade – nos termos do n.º 7 do artigo 262.º do RGIF, prorrogar o prazo de pronunciamento – 90 dias -, uma única vez, por 30 dias.
Enfim, a resolubilidade revela-se o âmago do planeamento da resolução, pois é o momento em que se analisam os aspectos mais sensíveis e complexos da IFB, que, portanto, fornece a visão mais nítida pertinente à sua saúde financeira e geral, além disso, pela influência na qualificação dos factos que despoletam a aplicação da medida de resolução.